Apocalipse Adiado: A História das Testemunhas de Jeová (Toronto: University of Toronto Press, 1997, segunda edição) de M. James Penton (1932-), pp. 47-76.

Capítulo 2: A Criação de uma Teocracia

M. James Penton


Em 6 de janeiro de 1917, o Juiz Joseph Franklin Rutherford,1 que durante alguns anos tinha sido o advogado pessoal de Russell, foi escolhido como presidente da Watch Tower Bible and Tract Society [Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados] e suas organizações associadas para substituir o falecido Pastor. Com a sua eleição, começou uma nova era na história dos Estudantes da Bíblia/Testemunhas de Jeová.

Joseph Franklin Rutherford

Nascido em 8 de novembro de 1869 no Missouri e criado na pequena quinta dos seus pais Batistas, Rutherford era um homem muito diferente de Russell. Em vez de crescer numa atmosfera de grande cidade sob a orientação amorosa de um pai próspero e benevolente, Rutherford teve de trabalhar muito duramente quase na pobreza. Graças a um grande esforço pessoal, ele estudou direito sob o velho sistema de aprendizado então muito comum nos Estados Unidos e passou nos seus exames de advogado em 1892. Em algumas ocasiões serviu como juiz substituto. Provavelmente em resultado destas experiências iniciais, e de um compromisso com os ideais populistas de William Jennings Bryan,2 ele desenvolveu uma forte personalidade, uma simpatia sincera embora raramente exteriorizada pelos oprimidos, e um desprezo completo pelo alto comércio, pelos políticos e, mais tarde, pelo clero.

Tal como Russell, Rutherford era um homem alto que, só pela sua presença, impunha respeito. Ele tinha uma voz alta, estrondosa, e parecia mesmo um senador americano de um Estado do Sul ou de perto das fronteiras. Ao lidar com amigos ele podia ser despótico; ao lidar com inimigos, implacável. A história oficial da Sociedade Torre de Vigia, Jehovah's Witnesses in the Divine Purpose [As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino], descreve-o como 'um tipo de pessoa enérgica e direta' com uma 'frontalidade na abordagem de problemas ao lidar com os seus irmãos que fazia com que alguns ficassem ofendidos.'3 De fato, ele era mal-humorado e por vezes brusco até ao ponto da grosseria, tendo um temperamento explosivo que podia ocasionalmente exaltá-lo até chegar à violência física. Também tinha um sentido de auto-justificação que o levava a encarar qualquer pessoa que se lhe opusesse como sendo do Diabo. Mais curioso ainda é o fato de apesar de em alguns aspectos ele ser um Puritano dos Puritanos, em outros era completamente dissoluto. Usava linguagem vulgar, sofria de alcoolismo, e foi certa vez acusado publicamente por um dos seus associados mais próximos de ter assistido a um espetáculo burlesco de nus, em companhia de dois anciãos e uma jovem mulher Estudante da Bíblia numa noite de quarta-feira antes da celebração do Memorial da Ceia do Senhor.4

No entanto, havia muito mais sobre ele do que esta descrição resumida, muito pouco lisonjeira, indicaria. Rutherford entrou em contato com os Estudantes da Bíblia pela primeira vez em 1894. Em 1906 ele foi batizado e pouco depois tornou-se um peregrino. Depois de algum tempo, ele tornou-se bastante popular entre os seus companheiros de crença porque, como advogado, travou batalhas em tribunal para limpar o nome de Russell, debateu publicamente em defesa das doutrinas dos Estudantes da Bíblia e, em 1915, escreveu uma apologia em benefício de Russell, intitulada A Great Battle in the Ecclesiastical Heavens [Uma Grande Batalha nos Céus Eclesiásticos].

Assim, foi a habilidade de Rutherford, a sua retórica dinâmica, e a sua disposição de lidar com os adversários dos Estudantes da Bíblia como um Jeremias do século 20 que fez dele um sucessor lógico de Russell. Consequentemente, apenas dois meses depois da morte de Russell, Rutherford foi eleito unanimemente como presidente da Sociedade Torre de Vigia e seus órgãos associados, embora Russell certamente não o tivesse designado como seu herdeiro espiritual.

De fato, Russell esperava que a sua posição como principal porta-voz para os Estudantes da Bíblia fosse assumida por uma liderança coletiva. Segundo a vontade dele, The Watch Tower [A Sentinela] devia estar sob a superintendência de uma comissão editorial de cinco pessoas, e nenhum artigo devia ser publicado sem o acordo de pelo menos três membros dessa comissão.5 Curiosamente, Rutherford não foi nomeado para a comissão e foi nomeado apenas como um de cinco membros alternativos possíveis.6 Portanto, embora Russell não tivesse tido qualquer intenção de passar a sua autoridade ou papel intacto para qualquer sucessor individual, Rutherford tinha outras idéias.

Rutherford era um autocrata que obviamente acreditava que para o bem da Sociedade -- e de todos os Estudantes da Bíblia -- ele devia governá-la com mão de ferro em vez de simplesmente administrar as decisões do seu corpo de diretores. Embora ele se recusasse a assumir o título de 'Pastor' em deferência para com a memória de Russell,7 usou a reverência dos Estudantes da Bíblia por Russell como uma estaca para a sua própria autoridade. Além disso, é óbvio que desde antes da sua primeira eleição, ele pretendia ter tanto ou mais poder do que o seu predecessor.8

O Cisma da Watch Tower de 1917

A história oficial das Testemunhas sugere que durante o curto período entre a morte de Russell e a eleição de Rutherford como presidente da Torre de Vigia, outros estavam conspirando para também alcançar esse cargo. São mencionadas várias figuras entre os 'conspiradores', mas o arquivilão, segundo este relato, era Paul S. L. Johnson. Assim, Johnson é descrito como sendo o principal instigador daquilo que em breve se tornaria um grande cisma na comunidade dos Estudantes da Bíblia durante o verão de 1917. Resumidamente, o relato da Torre de Vigia diz o seguinte.

Antes da sua morte, Russell tinha dado instruções a Alexander H. Macmillan, o seu assistente presidencial pessoal, para enviar Johnson à Grã-Bretanha para supervisionar as atividades da Associação Internacional dos Estudantes da Bíblia (IBSA) ali. Consequentemente, como parte do triunvirato que administrou os assuntos da Sociedade desde novembro de 1916 até à primeira semana de 1917, Rutherford despachou-o para Londres. Quando ele chegou, descobriu a organização britânica em tumulto e demitiu dois dos gerentes locais da Sociedade, H. J. Shearn e William Crawford. Segundo Johnson, estes homens estavam a conspirar para criar uma organização separada independente da Sociedade Torre de Vigia da América. Mas o próprio Johnson então tentou assumir um papel independente e alegou que ele, pessoalmente, era o sucessor de Russell e o encarregado que pagava o denário, mencionado na parábola de Jesus em Mateus 20:1-16. Depois de receber informação sobre o que se passava, Rutherford enviou um cabograma a Johnson ordenando-lhe que restabelecesse Shearn e Crawford.9

Nesse ponto Johnson começou a enviar cabogramas a Rutherford, com a certeza de que se ele fosse 'iluminado', iria apoiar Johnson. Ele acreditava que Rutherford era 'sem dúvida a vítima duma campanha de cabogramas engendrada por Shearn e Crawford'.10 Por isso ele enviou cabogramas com 85 a 115 palavras cada, nos quais se identificou a si próprio e a outros com Esdras, Neemias e Mordecai. Evidentemente ele pediu a Rutherford para servir como seu 'braço direito'.11

Rutherford ficou convencido que Johnson estava louco e enviou-lhe um cabograma, com a ordem de regressar à América. Depois disso Johnson enviou um cabograma para o Vice-Presidente da Torre de Vigia, Alfred I. Ritchie e para o Secretário-Tesoureiro William E. Van Amburgh, os outros dois membros do triunvirato, repudiando a autoridade de Rutherford. Usando a declaração de poderes que lhe fora concedida quando tinha sido enviado para a Grã-Bretanha, ele bloqueou a conta bancária dos Estudantes Internacionais da Bíblia e assumiu o controlo dos escritórios de Londres da IBSA. Ele e outro Estudante da Bíblia chamado Housden apoderaram-se de toda a correspondência, abriram o cofre da associação, e apoderaram-se de todo o dinheiro em caixa. Em resultado disso, Rutherford, que nessa altura era presidente, enviou por escrito um cancelamento da designação de Johnson e o advogado deste foi obrigado a desistir de um processo em tribunal para proibir os partidários de Rutherford de usarem as 800 libras que tinham sido temporariamente bloqueadas no banco.12

Liderados por Jesse Hemery, um partidário de Rutherford, um grupo de Estudantes da Bíblia nos escritórios e na residencial de Londres da IBSA acabaram por barricar Johnson no seu quarto. Para escapar, ele foi obrigado a sair pela janela e descer agarrando-se ao cano de escoamento de água. Depois disso, ele regressou a Nova Iorque, onde 'Rutherford concluiu que Johnson estava perfeitamente são em cada ponto, exceto um, a saber, sobre si mesmo.'13 Rutherford então reorganizou o trabalho da Sociedade na Grã-Bretanha sob Hemery e trouxe a paz. Johnson continuou a pedir para ser enviado de volta para aquele país, mas Rutherford recusou-se a enviá-lo.14

Seguiu-se uma luta áspera entre Joseph F. Rutherford e quatro membros da diretoria da Sociedade Torre de Vigia: Alfred I. Ritchie (que em janeiro tinha sido substituído na vice-presidência por Andrew N. Pierson), Robert H. Hirsh, Isaac F. Hoskins, e Dennis Wright. Segundo a versão da Torre de Vigia sobre estes acontecimentos, estes homens estavam descontentes com Rutherford no início de 1917 e 'ambiciosamente procuraram obter controle administrativo da Sociedade.' Em resultado disso, quando Johnson regressou a Brooklyn, ele influenciou a diretoria para trabalhar contra Rutherford.15

O relato da Torre de Vigia em seguida afirma que a diretoria decidiu emendar os estatutos da Sociedade com o objetivo de despojar Rutherford da sua autoridade legítima e transformá-lo numa figura ornamentativa. Em resultado disso, Rutherford foi obrigado a removê-los dos cargos. Ele obteve a opinião escrita de um advogado de Filadélfia, que não era Estudante da Bíblia, dizendo que como os quatro diretores não tinham sido eleitos legalmente em janeiro de 1917, mas eram meramente designados por Russell, não tinham direito legal de continuar no controlo da Sociedade. O Anuário das Testemunhas de Jeová de 1976 declara:

C. T. Russell designara tais homens quais diretores, mas os estatutos da Sociedade exigiam que os diretores fossem eleitos pelo voto dos acionistas. Rutherford tinha dito a Russell que os recomendados tinham de ser confirmados por meio de voto na seguinte reunião anual, mas Russell jamais dera tal passo. Assim, apenas os diretores principais que tinham sido eleitos na reunião anual de Pittsburgo eram membros da diretoria devidamente constituídos. Os quatro recomendados não eram membros legais da diretoria. Rutherford sabia disso durante todo o período de dificuldades, mas não mencionara isso, esperando que tais diretores cessassem sua oposição. No entanto, a atitude deles mostrava que não estavam aptos a ser diretores. Corretamente, Rutherford os demitiu, e designou quatro novos membros da diretoria, cuja designação pudesse ser confirmada na seguinte reunião geral da Sociedade, no início de 1918.16

Assim, em 12 de julho de 1917 Rutherford declarou secretamente que os quatro tinham sido removidos e substituiu-os por A. H. Macmillan, W. E. Spill, J. A. Bohnet, e G. H. Fisher, todos apoiantes de Rutherford que seriam confirmados na seguinte reunião geral da Sociedade.17

Em 17 de julho, Rutherford lançou The Finished Mystery [O Mistério Consumado] como um sétimo volume dos Studies in the Scriptures [Estudos das Escrituras] de Russell.18 Russell tinha falado muitas vezes da sua intenção de escrever o sétimo volume19 mas nunca tinha encontrado a 'chave' ou, mais provavelmente, o tempo e energia para o escrever. Agora, porém, Rutherford lançava um livro constituído por vários comentários retirados das obras de Russell, e por numerosos acréscimos dos co-autores, Clayton J. Woodworth e George H. Fisher, num comentário sobre Revelação, Ezequiel e o Cântico de Salomão. Descrito como sendo o trabalho póstumo do Pastor Russell, O Mistério Consumado era uma interpretação alegórica dos três livros das Escrituras e um panegírico a Russell.

O lançamento de The Finished Mystery [O Mistério Consumado] para a família do Betel da Torre de Vigia reunida -- o pessoal -- ao pequeno almoço, foi como uma bomba e, segundo a história da Torre de Vigia, serviu para causar um cisma aberto. Johnson, os diretores depostos e os seus apoiantes censuraram Rutherford num debate longo, amargo, à mesa do pequeno almoço.20 Em 27 de julho, para manter a paz, Rutherford pediu a Johnson para sair de Betel e, pouco depois, ele saiu com os ex-diretores.21

Em tudo isto, os apoiantes de Rutherford retrataram-no como sendo paciente e completamente justificado nas suas ações. Alexander H. Macmillan, escrevendo muitos anos depois, observou: 'Ele fez tudo o que podia para ajudar os seus opositores a verem o seu erro, fazendo várias reuniões com eles, tentando raciocinar com eles e tentando mostrar-lhes como o proceder deles era contrário à escritura da Sociedade e a todo o programa que Russell tinha seguido desde que a organização fora formada.'22 Mas, de fato, o relato oficial da Torre de Vigia e o retrato que Macmillan faz de Rutherford não passam de completas distorções da verdade.

Mesmo a descrição básica dada nos relatos da Torre de Vigia não é exata. É bem verdade que vários indivíduos viam-se a si mesmos como sucessores de Russell em perspectiva em novembro e dezembro de 1916. Também é verdade que Paul Johnson era uma pessoa estranha, errática, que causou muitos problemas a Russell através dos seus maus conselhos e que tinha visões de glória, para dizer o mínimo.23 Fora isso, a versão oficial [da Torre de Vigia] sobre os eventos de 1917 é falsa história.

Em primeiro lugar, Rutherford e os seus apoiantes estavam a praticar duramente políticas da igreja [ou congregação] e não eram anjos. Embora Rutherford certamente tivesse sido o candidato mais proeminente para a presidência, a sua eleição tinha sido largamente engendrada por dois homens -- Alexander H. Macmillan e William E. Van Amburgh.24 Segundo, à época da sua eleição, ele tinha insistido que os diretores aprovassem uma série de regulamentos que davam aos representantes da Sociedade uma autoridade grandemente ampliada.25 Terceiro, a designação que Rutherford fez para a escrita e publicação de The Finished Mystery [O Mistério Consumado] foi uma ação de exercício de autoridade demonstrando falta de consideração, unilateral, que certamente ignorou os direitos e prerrogativas da diretoria de vários membros da comissão editorial da Sociedade.26 Embora Rutherford alegasse que estava exercendo direitos que lhe tinham sido conferidos sob a escritura da People's Pulpit Association [Associação Púlpito do Povo] que dava ao presidente 'a supervisão geral e controlo e administração dos negócios e assuntos da dita corporação', isto não lhe dava poderes plenipotenciários para formular políticas.27 Além disso, tal como é o caso hoje com a Sociedade Torre de Vigia de Nova Iorque, a People's Pulpit Association [Associação Púlpito do Povo] era, para todos os efeitos práticos, tratada como subsidiária da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados e recebia dessa corporação todos os seus fundos de operação. Quarto, ele e o seu 'gabinete de cozinha' praticamente ignoraram os direitos de supervisão, não só dos quatro diretores, mas também do Vice-Presidente Pierson.28 Quinto, Rutherford, ao tentar agir como Russell fizera, de fato estava a ignorar os desejos expressos de Russell conforme delineados no seu testamento.29 E, finalmente, se Rutherford tivesse alguma vez sido levado a tribunal por ter demitido os quatro diretores, ele podia muito bem ter perdido. A sua afirmação de que eles não tinham sido legalmente eleitos não tem sustentação se for examinada de perto, particularmente no caso de Robert Hirsh, que nunca tinha sido designado por Russell e, durante algum tempo, fora apoiante de Rutherford. Depois, também, tal como apontaram o Vice-Presidente Pierson, os advogados dos diretores demitidos, e Paul Johnson, se os diretores não tinham sido legalmente eleitos, também não o tinham sido os três representantes da Sociedade: Rutherford, Pierson e Van Amburgh. Para poderem ser escolhidos como representantes em janeiro de 1917, eles precisavam de ter sido legalmente eleitos diretores. No entanto, não o tinham sido, e por isso, segundo a própria lógica de Rutherford, não detinham legalmente os cargos.30

A sugestão de que Rutherford e os seus apoiantes eram razoáveis, ao passo que os seus adversários não eram, também dificilmente se ajusta aos fatos. Macmillan, que continuava como assistente do presidente sob Rutherford, era um homem inteligente com uma personalidade aberta, agradável. Mas ele também era profundamente odiado pelos diretores que o viam como um conspirador e um político religioso de primeira ordem.31 Van Amburgh, um homem esperto, magro, de cabelo branco, com óculos e pêra, detestava procedimentos democráticos e controlava as contas da Torre de Vigia de modo que ninguém além do presidente da Sociedade as pudesse ver.32 Durante o julgamento do Trigo Milagroso, ele tinha prejudicado o Pastor Russell tanto quanto o ajudara, por não estar disposto a dar um testemunho franco.33 Mas o menos racional de todos era Clayton J. Woodworth, um dos co-autores de The Finished Mystery [O Mistério Consumado]. Em anos posteriores ele haveria de se provar um completo maníaco em assuntos de saúde e um odiador da profissão médica, ao passo que em 1917 era dado ao gênero de interpretações selvagens, alegóricas, nas quais Paul Johnson também se envolvera.

Com respeito a essas interpretações alegóricas, Woodworth até foi além de Johnson, um fato que levou um historiador a comentar que 'com toda a probabilidade, Johnson era tão são como os seus acusadores'.34 De fato, somos tentados a perguntar se, no que ao uso das Escrituras diz respeito, eles não eram todos igualmente malucos. Woodworth usou Mateus 20 para interpretar as atividades dos Estudantes da Bíblia em 1917 tal como Johnson tinha tentado fazer antes, e Rutherford e aqueles à sua volta evidentemente aceitaram as idéias de Woodworth. Num panfleto de cinco páginas intitulado The Parable of the Penny [A Parábola do Denário], Woodworth afirmava que o denário de fato representava The Finished Mystery [O Mistério Consumado], Cristo era o 'Senhor do vinhedo', e o 'encarregado' a quem Cristo falou na ilustração não era outro senão o Juiz Rutherford. As três centenas de colportores da Sociedade foram comparadas aos membros do grupo de Gideão em Juizes 7:3, 19-23. Os diretores demitidos eram vistos como os trabalhadores que queriam mais do que um denário como pagamento e que se queixaram contra o 'dono da casa'. Nesse caso, também se defendia que Rutherford era aquele 'dono'.

Sem dúvida foi o comportamento pessoal de Rutherford, no entanto, em vez do comportamento dos seus partidários, o que causou a maior parte dos problemas. Ele era extremamente secretivo e recusou-se a mostrar qualquer sentido de responsabilidade perante a diretoria. Ele não só manteve a impressão de The Finished Mystery em segredo do corpo editorial da Sociedade, mas também usou para a sua impressão dinheiro doado que nunca foi colocado nas contas da Sociedade.35 Igualmente sério, ele e Van Amburgh recusaram peremptoriamente que outras pessoas inspecionassem os livros da Sociedade ou fizessem uma auditoria. Quando o Vice-Presidente Andrew N. Pierson, o homem que tinha originalmente nomeado Rutherford para o cargo de presidente, pediu para vê-los, foi-lhe dito que só o poderia fazer se concordasse em renunciar ao seu cargo.36 Pierson declarou publicamente por escrito: 'Nós nunca tivemos um relatório satisfatório do tesoureiro desde que tenho sido um diretor. Não sabemos qual é a situação do trust fund, nem qual é a situação da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. Quais são as relações financeiras entre a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados e a Associação do Púlpito do Povo? Como é investido o trust fund? Quais são os títulos de crédito? Quanto rendem?'37 Depois, também, poucos viam em Rutherford a bondade que Macmillan via. Johnson afirmou que durante as audições que o Juiz fez com ele depois de regressar da Grã-Bretanha, Rutherford foi tanto cruel como cheio de ódio.38

Imediatamente antes de Johnson ter sido obrigado a sair de Betel em 27 de julho de 1917, os diretores depostos e o Vice-Presidente Pierson afirmaram que Rutherford voltou-se contra ele num acesso de raiva e atacou-o fisicamente. O relato completo deles declara:

Na refeição do meio-dia, o Irmão Rutherford relatou à família de Betel que nós seríamos obrigados a deixar o lar de Betel ao meio-dia de segunda-feira. Os irmãos então consideraram seu dever fazer uma declaração à Família. O Irmão Rutherford desejava que a Família só ouvisse a declaração dele; mas nós insistimos, e um de nós disse que desejava ler uma carta do Irmão Pierson declarando que ele 'tomaria posição a favor da antiga diretoria'. O Irmão Rutherford recusou-se a deixar que a carta fosse lida e gritou que o Irmão Johnson tinha ido ver o Irmão Pierson e tinha deturpado o assunto para ele. Depois de o Irmão Johnson ter negado isso firmemente, o Irmão Rutherford correu para ele e, usando força física, que quase levantou o irmão Johnson no ar, disse num acesso de fúria: 'Você vai deixar esta casa antes da noite; se você não sair, será posto fora.' Antes de anoitecer esta ameaça foi cumprida. Os pertences pessoais do Irmão Johnson foram literalmente postos fora do Lar de Betel e foram colocados irmãos como vigias em várias portas para o impedir de entrar novamente na casa.39

De fato, ao tomar o controlo completo da Sociedade Torre de Vigia em 1917, Rutherford agiu exatamente como se estivesse a levar a cabo uma purga ao estilo do partido comunista em vez de proteger a Sociedade de 'opositores'. Ele não tinha visto nada de errado em mandar Macmillan chamar um polícia para que Wright, Hoskins, Ritchie e Hirsh -- nessa altura plenamente reconhecidos como diretores da Sociedade Torre de Vigia -- fossem expulsos dos escritórios da Sociedade na Hicks Street,40 apesar de ele ainda estar sob obrigação de os encarar como irmãos em Cristo. E quando os quatro foram obrigados a abandonar o Betel de Brooklyn, foram tratados com a maior rudeza que Rutherford e os seus apoiantes conseguiam manifestar. Mais tarde Hirsh e Hoskins foram removidos de diretores da People's Pulpit Association [Associação Púlpito do Povo], provavelmente de forma bastante ilegal, quando em 31 de julho Rutherford e Macmillan usaram procurações de detentores das ações dessa organização, que lhes tinham sido confiadas para a eleição de janeiro anterior, para fazerem uma votação e removê-los dos cargos.41

Não se deve inferir disto que os diretores demitidos estavam sem falhas; não estavam. A eclésia de Nova Iorque dos Estudantes da Bíblia viu falhas em ambos os lados das querelas no interior da Sociedade.42 O Vice-Presidente Pierson vacilou entre Rutherford e os seus adversários, mas no fim morreu em associação com o presidente da Sociedade.43 No entanto, retrospectivamente, o que Ritchie, Hirsh, Hoskins e Wright exigiam de Rutherford parece muito mais razoável do que a Sociedade gostaria de admitir hoje. Talvez mesmo os representantes da Sociedade saibam isso. Tão recentemente como em 1950, quando William Cumberland, então trabalhando numa dissertação de doutoramento na Universidade de Iowa, procurou examinar os documentos da Sociedade relativos ao cisma de 1917, eles recusaram-se a deixá-lo vê-los. Ele foi obrigado a obtê-los dos Dawn Bible Students [Estudantes da Bíblia da Aurora], em muitos sentidos os herdeiros dos adversários de Rutherford.44

A expulsão de Johnson e dos ex-diretores de Betel foi seguida por uma guerra de panfletos, com as várias partes apresentando as suas versões da questão. Os oponentes de Rutherford esperavam desalojá-lo na próxima reunião anual dos detentores das ações da Sociedade, agendada para janeiro de 1918. Eles sugeriram que Menta Sturgeon, o secretário privado de Russell e o homem que estava com ele quando morreu, daria um bom presidente.45 Mas Rutherford puxou-lhes completamente o tapete debaixo dos pés. O juiz convocou uma sondagem democrática entre os Estudantes da Bíblia em novembro de 1917. Embora a sondagem não fosse vinculativa, lançou a base para a reeleição dele e dos seus associados. Sem dúvida a comunidade dos Estudantes da Bíblia olhava para a Sociedade como uma instituição sagrada porque esta tinha estado associada tão de perto com Russell. Assim, como Rutherford controlava a Sociedade durante o outono e inverno, ele obteve o apoio da maioria dos Estudantes da Bíblia, embora uns poucos soubessem o que se estava a passar.46

Quando os detentores das ações se reuniram, Rutherford foi reeleito ao passo que os seus oponentes só receberam uma pequena percentagem dos votos. Até o Vice-Presidente Pierson, que tinha vacilado no seu apoio ao juiz, falhou em manter uma posição na diretoria.47 Consequentemente, os quatro diretores depostos e Johnson tinham de se submeter a Rutherford e aos seus associados ou separar-se permanentemente. Eles escolheram este último rumo.

Na primavera de 1918 os dissidentes resolveram reunir-se separadamente para a celebração anual do Memorial da Refeição Noturna do Senhor, com aqueles grupos de Estudantes da Bíblia que os apoiavam. Desenvolveram-se dois novos movimentos: um à volta de três dos quatro anteriores diretores da Torre de Vigia, e outro à volta de Paul Johnson. Estes foram o Pastoral Bible Institute [Instituto Bíblico Pastoral] e o Laymen's Home Missionary Society [Sociedade Missionária da Casa do Leigo].48 Na costa oeste dos Estados Unidos e do Canadá um terceiro grupo, chamndo-se a si mesmos 'Standfasters' [Intransigentes], também se separou da Sociedade. Embora sem dúvida eles tivessem sido afetados pelos acontecimentos de Nova Iorque, a sua preocupação primária era que a Sociedade não se tinha oposto com firmeza ao envolvimento em ações patrióticas durante a Primeira Guerra Mundial.49

Os Estudantes da Bíblia e a Primeira Guerra Mundial

Conforme indicado anteriormente, Russell e os Estudantes da Bíblia opunham-se fortemente à participação na guerra. Embora a vissem como um cumprimento da profecia, eles encaravam as nações envolvidas como estando controladas por demônios e fora do favor de Deus. Em resultado disso, homens dos Estudantes da Bíblia que se recusavam a servir como combatentes quando eram convocados para o serviço militar muitas vezes passavam por aprisionamento e tratamento brutal, e em alguns casos foram executados.50

Quando a Sociedade Torre de Vigia lançou uma campanha acutilante contra o apoio do clero à guerra nos Estados Unidos, Canadá e Grã-Bretanha durante o verão de 1917, a reação não se fez esperar. Durante o outono desse ano os Estudantes da Bíblia canadianos distribuíram em grandes números O Mistério Consumado e tratados intitulados The Bible Students Monthly [O Mensário dos Estudantes da Bíblia], e ambos continham ataques ao militarismo e ao clero.51 Em janeiro de 1918, o governo canadiano baniu essas publicações e começou uma campanha de perseguição em larga escala contra os Estudantes da Bíblia.52

O clero e outros levantaram um clamor contra eles nos Estados Unidos. Estudantes da Bíblia começaram a ser presos, atacados por multidões, cobertos por alcatrão e penas, e molestados em todo o país.53 Foram dadas ordens de prisão para oito diretores da Sociedade Torre de Vigia: J. F. Rutherford, W. E. Van Amburgh, A. H. Macmillan, R. J. Martin, C. J. Woodworth, G. H. Fisher, F. H. Robinson e Giovanni De Cecca. A acusação contra eles era sedição sob os termos da Lei Americana de Espionagem. Em 21 de junho, sete deles foram sentenciados a vinte anos [de prisão] cada um na penitenciária federal de Atlanta, Georgia [E.U.A.]; De Cecca foi condenado a dez anos. Treze dias mais tarde, depois de lhes ter sido recusada fiança enquanto esperavam pela apelação, os oito foram levados para Atlanta, onde ficariam detidos durante nove meses. Nesse tempo, o resto do pessoal da sede da Sociedade Torre de Vigia mudou-se de Brooklyn de volta para Pittsburgh. Embora eles continuassem a publicar The Watch Tower and Herald of Christ's Presence [A Torre de Vigia e Arauto da Presença de Cristo], em praticamente tudo o resto os Estudantes da Bíblia pareciam estar quase destruídos enquanto movimento.54

Depois do inverno, Rutherford e os seus diretores associados foram encorajados pela sua reeleição para os cargos por membros da Sociedade Torre de Vigia reunindo-se em Pittsburgh em janeiro de 1919. Macmillan encarou essa eleição como um sinal do favor de Jeová. Admitindo involuntariamente que todas as eleições anteriores dos representantes da Sociedade tinham sido predeterminadas -- incluindo aquela realizada em 1917 -- ele disse ao Juiz Rutherford: 'Esta é a primeira vez desde que a Sociedade foi incorporada que se tornou claramente evidente quem Jeová gostaria que servisse como presidente.'55 Claro que o grupo anti-Rutherford já tinha sido purgado das fileiras da Sociedade e já não era uma ameaça. Em segundo lugar, os diretores detidos eram agora vistos como mártires por Estudantes da Bíblia que estavam eles próprios a ser perseguidos. Considerando todas as coisas, teria sido surpreendente se Macmillan não tivesse recebido o seu sinal de favor divino.

Em março de 1919, o Juiz Louis Brandeis do Supremo Tribunal dos Estados Unidos ordenou que Rutherford e os seus diretores associados fossem libertados sob fiança. Em abril, o Juiz Ward do Segundo Tribunal Federal de Apelação de Nova Iorque declarou: 'Os réus neste caso não tiveram o julgamento moderado e imparcial ao qual tinham direito, e por esta razão o julgamento é anulado.' Um ano mais tarde o governo dos Estados Unidos desistiu de todas as acusações contra eles.56

Reorganização no Pós-Guerra

Depois da sua libertação de Atlanta, o Juiz Rutherford começou uma grande reorganização das atividades dos Estudantes da Bíblia. Em 4 de maio de 1919, ele discursou num congresso em Los Angeles, e quando os seus comentários foram bem recebidos, ele decidiu convocar um congresso geral dos Estudantes da Bíblia americanos e canadianos em Cedar Point, Ohio.57 Em Cedar Point ele declarou que os Estudantes da Bíblia têm de 'levar ao mundo a mensagem divina de reconciliação'; e para ajudá-los ele anunciou a publicação de uma nova revista, The Golden Age [A Idade de Ouro],58 em violação de uma provisão específica no testamento de Russell.59

No outono de 1919, os Estudantes da Bíblia começaram a distribuição regular de casa em casa da The Golden Age.60 Mais importante, em 1920 'trabalhadores de classe', isto é, Estudantes da Bíblia individuais envolvidos em evangelização pública, começaram a relatar as suas atividades à Sociedade Torre de Vigia. Jehovah's Witnesses in the Divine Purpose [As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino] indica de forma um tanto incorreta o que estava então ocorrendo sob o novo presidente da Sociedade Torre de Vigia: 'O endurecimento da responsabilidade de pregação começou em 1920 quando se requereu que todos na congregação que participavam no trabalho de pregação entregassem um relatório semanal. Antes de 1918 só os colportores ou pioneiros [evangelistas a tempo inteiro] tinham relatado a sua atividade de serviço. Designações específicas de território estavam sendo feitas às congregações para o seu próprio trabalho de campo. No primeiro ano de relatórios, 1920, havia 8.052 "trabalhadores de classe" e 350 pioneiros.'61 Assim começou uma das maiores campanhas de proselitismo na história -- uma campanha que continua até hoje.

Rutherford estava ansioso por estender as atividades de pregação a terras fora dos Estados Unidos. Assim, em 1920, ao mesmo tempo que o trabalho de pregação pública estava sendo reorganizado ao nível congregacional, ele fez várias mudanças importantes na organização dos Estudantes da Bíblia no estrangeiro. O escritório da filial canadiana dos Estudantes Internacionais da Bíblia foi mudado de Winnipeg, Manitoba, para Toronto, Ontário.62 Numa viagem à Grã-Bretanha, continente europeu, Palestina e Egito, o juiz providenciou para o estabelecimento de um escritório e complexo de impressão numa filial Centro-Européia da Torre de Vigia em Zurique, Suíça.63 Adicionalmente, ele criou outra filial em Ramallah, Palestina, à vista de Jerusalém.64 Em 1921 houve mais expansão, e a Torre de Vigia contava dezoito filiais estrangeiras e doze escritórios de filial americanos, formados para servir grupos de línguas estrangeiras nos Estados Unidos.65

Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão

Um fator importante no crescimento do número e atividade dos Estudantes da Bíblia durante o início da década de 1920 era algo mais do que organização melhorada; era a campanha 'Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão'. Pouco antes da sua detenção em 1918, o Juiz Rutherford tinha dado um discurso com esse título na Califórnia, mas não foi senão em setembro de 1920 que um livro com o mesmo nome foi publicado e anunciado por um grande programa de discursos e anúncios em jornais. O livro foi traduzido para onze línguas estrangeiras -- incluindo yiddish, malaio e burmês -- e tornou-se um best-seller. O que evidentemente suscitou tanto interesse, além do título da nova publicação, foi a sugestão de que o milênio começaria em 1925. Essa projeção, baseada nos cálculos do Ano do Jubileu originalmente publicados em Three Worlds, levou Rutherford a especular que haveria uma 'restauração completa' da humanidade nesse tempo. Além disso, ele declarou: 'podemos esperar em 1925 a volta desses homens fiéis de Israel [Abraão, Isaque e Jacó], ressurgindo da morte e completamente restituídos à perfeição humana, os quais serão visíveis e reais representantes da nova ordem das coisas na terra.'66

É verdade que o juiz, tal como o Pastor Russell antes dele, não alegava inspiração para as suas idéias e no ano seguinte adotou uma posição mais cuidadosa em The Harp of God [A Harpa de Deus]. Ali ele observou: 'A cronologia, pelo menos em certa medida, depende de cálculos exatos e há sempre alguma possibilidade de erros. Profecia cumprida é o registo de fatos físicos que realmente existem e estão definitivamente fixos.'67 No entanto, nem Rutherford nem os seus colegas prestaram realmente muita atenção a essa qualificação e continuaram a proclamar as predições publicadas em Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão. Por exemplo, em The Way to Paradise [O Caminho Para o Paraíso], publicado em 1924, William E. Van Amburgh profetizou em detalhe ainda maior tudo o que ocorreria no ano seguinte e imediatamente depois.68 Consequentemente, à media que 1925 se aproximava, foi gerada grande excitação entre os Estudantes da Bíblia. Segundo relatos ainda circulados por pessoas que eram membros da comunidade dos Estudantes da Bíblia naquela época, muitos desistiram dos seus negócios, empregos e até venderam as suas casas na expectativa de em breve estarem vivendo num paraíso terrestre. Assim, quando o Juiz Rutherford admitiu na Watch Tower de 15 de fevereiro de 1925 que talvez se tivesse esperado demasiado para aquele ano,69 era tarde demais. Muitos agricultores Estudantes da Bíblia tanto no Canadá como nos Estados Unidos recusaram-se a semear os seus campos na primavera e ridicularizaram os seus correligionários que o fizeram. Assim, quando 1926 chegou sem o aparecimento de Abraão e dos outros 'notáveis da antigüidade', e sem sinais do paraíso, houve grande desapontamento.

Embora Rutherford não admitisse qualquer culpa real sobre o assunto nas publicações da Sociedade, ele deu desculpas descaracterizadas em congressos da IBSA. Evidentemente, ele também estava desgostoso. Num discurso público dado na Austrália no início de 1975, o atual [1985] presidente da Sociedade Torre de Vigia, Frederick W. Franz, declarou que o juiz tinha admitido 'que fizera figura de asno em 1925'. No entanto, isto não o impediu de continuar a proclamar que o fim do mundo estava 'iminente' e que poderia ser esperado dentro de poucos anos ou até poucos meses. O fato de ele ter profetizado falsamente também não lhe parece ter dado segundos pensamentos sobre a campanha de pregação dos Estudantes da Bíblia, sobre o seu ministério ou o seu desejo de manter e aumentar os seus poderes pessoais. Mas como os acontecimentos acabariam por mostrar, muitos Estudantes da Bíblia tinham um sentimento muito diferente: a débâcle de 1925, junto com o crescente ressentimento contra o presidente da Torre de Vigia, levaria muitos milhares a sair do movimento nos anos seguintes.

O Ministério de Rutherford

Durante os anos que se seguiram a 1925, Rutherford fez sair um dilúvio de novos livros e folhetos, incluindo Deliverance [Libertação] em 1926, Creation [Criação] em 1927, Reconciliation [Reconciliação], Government [Governo] e Life [Vida] em 1929, e vários outros até à publicação de Children [Filhos], a sua última obra, em 1941. De fato, ele produziu uma média de um livro por ano, e as suas publicações alcançaram um total de 36 milhões de cópias.70 Mas ele não era apenas um escritor. Ele provou ser em todos os pormenores tanto um dínamo humano como o Pastor Russell tinha sido. Vez após vez ele discursou nos congressos da Torre de Vigia, na rádio nacional e internacional entre meados da década de 1920 e 1937, e em muitas gravações de fonógrafos.

Congressos

Também muito importante foi o fato de Rutherford ter transformado os congressos dos Estudantes da Bíblia/Testemunhas de Jeová em grandes eventos de publicidade. Embora os congressos tivessem sido importantes durante a vida de Russell, pouco mais eram do que reuniões espirituais para os próprios Estudantes da Bíblia. Sob Rutherford isso mudou dramaticamente.

Entre 1922 e 1928 a Sociedade Torre de Vigia realizou uma série de congressos que as Testemunhas de Jeová hoje acreditam terem sido os sete toques angélicos de trombeta mencionados em Revelação 8:1-9 e 11:15-19.71 Assim, cada congresso condenou parte da 'organização de Satanás' ou o próprio Satanás. Em 1922, em Cedar Point, Ohio, o apoio do clero à Liga das Nações foi condenado como deslealdade ao reino de Cristo. Imediatamente depois, cerca de 45 milhões de cópias de uma resolução nesse sentido foram distribuídas em todo o mundo. No ano seguinte, em Los Angeles, os Estudantes da Bíblia presentes aprovaram uma resolução intitulada 'Um Aviso', que mais uma vez atacava o clero e também foi circulada por todo o mundo. Em Columbus, Ohio, em 1924, eles adotaram a 'Acusação' contra homens do clero e distribuíram ainda mais cópias de um tratado intitulado Ecclesiastics Indicted [Acusados os Eclesiásticos] do que tinham feito com resoluções anteriores. Depois, em 1925, em Indianapolis, Indiana, proclamaram uma 'Mensagem de Esperança' para a humanidade mas continuaram a condenar a cristandade e os seus líderes religiosos. Em Londres, Inglaterra, em 1926, eles bradaram em aprovação de 'Um Testemunho aos Governante das Nações', que censurava a Grã-Bretanha e o mundo. No ano seguinte, em Toronto, Ontario, o Juiz Rutherford leu uma resolução a 15.000 Estudantes da Bíblia reunidos, intitulada 'Aos Povos da Cristandade'. Um discurso de apoio, 'Liberdade para os Povos', foi transmitido por uma cadeia internacional de cinqüenta e três estações de rádio, um número espantoso para aquele tempo. Finalmente, em 1928, em Detroit, Michigan, os Estudantes da Bíblia aceitaram uma 'Declaração Contra Satanás e a Favor de Jeová'.72

Em anos posteriores outros congressos também foram de grande importância, especialmente um realizado em Washington, DC, em 1935, e outro realizado em St. Louis, Missouri, em 1941. Nesta assembléia, a última do Juiz Rutherford, estiveram presentes cerca de 115.000 pessoas,73 e as Testemunhas de Jeová puderam desafiar abertamente a terrível perseguição que então as estava a atingir como uma onda gigante em resultado da acusação de que elas eram não eram patrióticas e eram inimigas das nações em que viviam.

O Poder Crescente de Rutherford

Ao mesmo tempo que estava a realizar as suas atividades de escrita e pregação, Rutherford gradualmente começou a ganhar maior controlo sobre a comunidade dos Estudantes da Bíblia. Ele tinha-se tornado absoluto no que dizia respeito aos negócios da Sociedade em 1917. Em 1925 ele tornou-se igualmente absoluto na determinação de quais as doutrinas que deviam ser ensinadas nas publicações da Torre de Vigia. Passando por cima das objeções da comissão editorial da Sociedade, ele publicou um artigo importante e revolucionário em termos doutrinais, intitulado 'Nascimento da Nação'.74 Em resultado disso, ele destruiu a comissão.75 Mas as eclésias ainda eram relativamente independentes sob os seus próprios anciãos eleitos. No entanto, isso não duraria muito. Tal como Paul Johnson tinha suspeitado anteriormente,76 Rutherford estava determinado a colocá-los sob o controlo centralizado da Torre de Vigia em nome do que ele mais tarde decidiu chamar 'Governo Teocrático'.

Segundo Rutherford, o propósito principal da comunidade dos Estudantes da Bíblia era pregar. Para cumprir esse requisito, tinha de ser feito tudo para promover o evangelismo -- especialmente evangelismo de porta a porta com as publicações da Sociedade. Assim, todos os congressos de 1919 em diante enfatizaram a importância de anunciar a mensagem da Torre de Vigia.

Com o passar do tempo, a barragem constante de propaganda convenceu muitos Estudantes da Bíblia de que, num sentido estranho, eles tinham de 'publicar ou perecer'. Na década de 1920 Rutherford passou a afirmar que todos os cristãos têm de pregar publicamente em cumprimento de Mateus 24:14. No entanto, apesar de tal pressão constante, outros -- talvez a maioria -- resistiram a ser arregimentados para o trabalho de pregação. Muitos ainda mantinham a crença, dos tempos de Russell, de que a edificação do caráter ou santificação cristã era mais importante do que o proselitismo. Muitos também não podiam aceitar o argumento de que se requeria que todos testemunhassem de porta em porta. E, mais importante, muitos anciãos eleitos ressentiram-se da crescente autoridade e manipulação da Sociedade sobre as congregações locais. Consequentemente, para atingir o seu objetivo de um domínio completo sobre a comunidade dos Estudantes da Bíblia, Rutherford teve de tomar algumas medidas. Entre estas, ele teve de destruir o conceito de santificação ou desenvolvimento do caráter, e também a idéia de que Russell tinha sido o servo fiel e sábio.

Para realizar a primeira medida, ele publicou um artigo na The Watch Tower [A Sentinela] de 1.º de maio de 1926, na qual desacreditou completamente o termo 'desenvolvimento do caráter'. Curiosamente, se olharmos para esse artigo e o compararmos com as declarações de Russell na matéria, veremos que Rutherford estava a atacar um straw man [caricatura ou deturpação das declarações de Russell]. No entanto, ao desacreditar o velho conceito dos Estudantes da Bíblia da santificação como 'obra de retidão', ele pode, paradoxalmente, colocar maior ênfase na obra do evangelismo.

Era óbvio, porém, que enquanto a Sociedade distribuísse as obras de Russell e continuasse a encará-lo como o servo fiel e sábio, os Estudantes da Bíblia estariam relutantes em adotar inquestionavelmente as idéias de Rutherford. Assim, na Watch Tower [Sentinela] de 1.º de janeiro de 1927 Rutherford publicou um artigo que foi obviamente produzido para desacreditar a reputação de Russell. Entre outras coisas esse artigo declarou: 'O esquema do inimigo é afastar o homem de Deus, induzindo o homem a reverenciar algum outro homem; e dessa forma muitos caem no laço do Diabo.'77

Pouco depois, em fevereiro do mesmo ano, a Sociedade abandonou a idéia de que Russell tinha sido o servo fiel e sábio; dali em diante 'aquele servo' devia ser encarado como sendo o remanescente dos eleitos de Deus na terra -- aqueles dos 144.000 santos de Revelação 14:1 que ainda não se tinham juntado a Cristo na glória celestial.78

Ao mesmo tempo que Rutherford estava a desacreditar a memória de Russell e os seus ensinos, ele estava


Assistência ao memorial dos Estudantes da Bíblia, 1917-1928

a aumentar a sua própria autoridade. Conforme Timothy White indica de forma tão convincente através da citação de excertos da The Watch Tower [A Sentinela], o que Rutherford fez foi mudar a definição do termo 'Sociedade' para passar a significar a inteira comunidade dos Estudantes da Bíblia -- de fato, a igreja. Segundo White, em 1919 e 1920 Paul Johnson pôs em circulação um artigo intitulado 'The Church Organized in Relation to the Society' [A Igreja Organizada em Relação com a Sociedade]. Nesse artigo Johnson argumentou que a Sociedade devia ser o servo da igreja (os Estudantes da Bíblia) em vez de ser o seu dono. Em resposta, Rutherford defendeu que: 'Embora a Sociedade seja uma pessoa jurídica que tem necessariamente representantes e servos, em si mesmos estes não constituem a Sociedade. Num sentido mais amplo, a Sociedade é composta do corpo de cristãos organizados de maneira ordeira sob a direção do Senhor para o desempenho do seu trabalho.' Por esta definição, conforme White afirma, Rutherford estava a alegar que por ser o presidente da Sociedade, ele era também de fato o 'presidente da igreja.'79 Embora o juiz não se atrevesse a fazer essa alegação de forma tão explícita, por volta de 1940 a Sociedade Torre de Vigia tinha passado a reconhecer esse fato abertamente. Consolation [Consolação] (a The Golden Age [A Idade de Ouro] sob um novo nome) declarou: 'A Teocracia é presentemente administrada pela Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados, da qual o Juiz Rutherford é o presidente e administrador geral.'80

O Novo Nome

Durante os anos que se seguiram a 1919, Rutherford e os seus associados rotularam os seus companheiros Estudantes da Bíblia que já não aceitavam as direções da Sociedade como 'servos iníquos', a 'classe de Judas' e a 'classe de Dalila'. No entanto, muitos Estudantes da Bíblia associados com a Torre de Vigia ainda continuavam a encarar tais pessoas como irmãos em Cristo. Consequentemente, para diferenciar mais claramente os seus seguidores dos muitos Estudantes da Bíblia independentes, em 26 de julho de 1931, às 16 horas, Rutherford leu uma resolução perante um congresso da Torre de Vigia reunido em Columbus, Ohio, na qual os convidou para que aceitassem o novo nome: 'Testemunhas de Jeová'.81

Os argumentos que o Juiz usou eram uma obra prima de lógica falaciosa e má exegese. Por exemplo, ele usou Isaías 62:1, 2 na tradução de Rotherham para mostrar que o povo de Deus haveria de receber 'um novo nome'. Mas, conforme Timothy White observa, se ele se tivesse dado ao trabalho de ler mais dois versículos teria descoberto que o novo nome seria 'Hefzibá', e não 'Testemunhas de Jeová'.82 No entanto, a escolha do novo nome foi um audacioso golpe de gênio da parte de Rutherford. Pois provavelmente mais do que qualquer outra coisa, deu uma proeminência e singularidade aos apoiantes da Torre de Vigia que nada mais poderia ter dado. Também serviu como uma importante separação psicológica em relação a Russell e ao passado dos Estudantes da Bíblia, e foi um passo importante na criação de um arranjo 'teocrático' altamente centralizado sob Rutherford e os seus sucessores escolhidos a dedo. É claro que isso ofendeu alguns Estudantes da Bíblia que antes tinham permanecido leais à Sociedade; de fato, isso representava a adoção de um nome sectário em violação de um dos ensinos mais sentidos de Russell. Mas Rutherford sem dúvida queria que tais pessoas se submetessem ou abandonassem o movimento de qualquer maneira. Para o juiz, todos os que não estavam completamente a favor dele, estavam contra ele -- e contra Jeová também.

O Desenvolvimento do Governo Teocrático

As mudanças nas doutrinas dos Estudantes da Bíblia a respeito de escatologia, desenvolvimento do caráter e o servo fiel e sábio levaram muitos a sair do movimento.83 O artigo 'Nascimento da Nação' em 1925 por si só evidentemente fez com que muitos saíssem.84 Porém, enquanto as congregações ou eclésias locais fossem governadas pelos seus próprios anciãos e organizassem os seus próprios assuntos, podiam, se assim entendessem, ignorar a maior parte dos pronunciamentos de Rutherford e continuar em associação com outros Estudantes da Bíblia. Por isso, Rutherford decidiu dominar os anciãos ou, se isso não resultasse, aboli-los como classe.

Conforme observado anteriormente, ele usou o argumento de que a Sociedade (a inteira comunidade dos Estudantes da Bíblia) era consagrada para levar a cabo um grande testemunho ou trabalho de pregação nos 'últimos dias'. Consequentemente, qualquer pessoa que se opusesse ao trabalho da Sociedade (a Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados) conforme dirigida pelo seu presidente, estava a opor-se à vontade de Deus. Assim, ele disse que os anciãos que se recusassem a obedecer às ordens de Brooklyn eram 'vaidosos', 'arrogantes' e uma legião de outros epítetos que Rutherford gostava de usar para se referir a eles.85

O juiz era demasiado prudente para simplesmente atacar os anciãos sem ter outros para colocar no seu lugar. Durante os anos de 1919 a 1932, ele aumentou gradualmente o seu controlo sobre congregações locais de Estudantes da Bíblia através do desenvolvimento de novas atividades de pregação dirigidas pela Sociedade, que foram colocadas sob a superintendência dos diretores de serviço que tinham primeiro sido nomeados para distribuir a The Golden Age [A Idade de Ouro] em 1919. Estas novas atividades incluíam a circulação de várias resoluções adotadas em congressos e, a partir de 1926, a distribuição de casa em casa de literatura da Torre de Vigia. Consequentemente, o que Rutherford estava a fazer era construir em cada congregação um corpo de diretores pregadores partidários da Sociedade. Embora fossem nomeados localmente pelas eclésias, eram designados pela Sociedade, e tendiam a ser leais a Rutherford e à Sociedade em todos os assuntos.86

Ao mesmo tempo, Rutherford decidiu enfraquecer a autonomia congregacional mudando a natureza das reuniões locais. Ele sugeriu que as reuniões tradicionais de oração e testemunho dos Estudantes da Bíblia fossem divididas em duas partes, uma delas tornando-se uma 'reunião de serviço' -- dedicada quase exclusivamente a promover o trabalho de pregação pública. Discursos públicos ou sermões, proferidos sobre vários temas selecionados pelos anciãos, foram desencorajados ao passo que foram encorajados estudos da The Watch Tower [A Sentinela], do tipo pergunta-e-resposta. Assim, gradualmente e subtilmente, o juiz passou a controlar mais e mais a dieta espiritual administrada às congregações dos Estudantes da Bíblia.87

Rutherford e os seus apoiantes ainda estavam, tão tarde como em 1932, irritados com a independência de alguns anciãos e a sua má vontade em aceitar inquestionavelmente as ordens da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. Depois de muita discussão, o juiz decidiu resolver o problema eliminando os anciãos. Assim, apareceu na Watch Tower [Sentinela] de 1.º de fevereiro de 1932 uma carta -- obviamente plantada ali tendo em vista eventos futuros -- de Charles Morrell, um Estudante da Bíblia de longa data e secretário privado do Presidente do Supremo Tribunal Canadiano, Sir Lyman Duff. A carta, que apareceu na página 47, diz:

A seguinte pergunta é submetida tanto para consideração como para resposta, pois suponho que se o ponto envolvido for sólido, será tratado pela Watch Tower [Sentinela] no devido tempo.

Essencialmente, o apóstolo diz que o espírito santo fez dos anciãos superintendentes do rebanho de Deus. Tendo o próprio Senhor agora assumido a superintendência de Sião, ainda há justificação para o serviço de anciãos?

Expresso de forma diferente, não era o propósito do Senhor limitar a jurisdição dos anciãos ao tempo da ausência da terra do Senhor Jesus, começando com a sua ascensão, e dando o espírito santo como guia e instrutor, e a vinda de Cristo Jesus ao templo?

Evidência externa para isto pode residir no fato de ter havido lugar para considerável criticismo dos anciãos em anos recentes, particularmente desde 1922. Chamados a servir, muitos deles provaram ser 'um espinho na carne' da Sociedade, dos diretores, da organização de serviço e dos trabalhadores fiéis. A eleição deles, supostamente expressando a 'Vontade do Senhor' pelo espírito santo, freqüentemente resultou em oposição à 'mente do Senhor' conforme manifestada através da Sociedade.

Será que a remoção do espírito santo não implica o fim do governo da igreja das 'fileiras para cima', e a vinda do Rei ao seu templo não implica o governo da igreja do 'trono para baixo'? E se é assim, não temos nós uma organização dual, governada do 'trono para baixo' e das 'fileiras para cima'?

Sendo a resposta afirmativa, não seria nos interesses do reino, e biblicamente correto, dispensar completamente os anciãos e diáconos, e substituí-los por instrutores da mesma maneira como são nomeados os diretores?

Com caloroso amor cristão, pela Sua graça, sou,

Vosso irmão,

Charles Morrell, Ontario.

Em 'resposta' direta às perguntas de Morrell, os números de 15 de agosto e 1.º de setembro de 1932 da The Watch Tower [A Sentinela] exigiram a abolição dos anciãos congregacionais eleitos, indo ao extremo de afirmar que o cargo de ancião era claramente antibíblico. Em resultado disso, acabou-se com o sistema de anciãos e diáconos democraticamente eleitos que tinha existido durante mais de cinqüenta anos. Dali em diante, as publicações da Sociedade continuaram a lançar ridículo sobre os anciãos eleitos. Eles foram descritos como 'arrogantes' e 'preguiçosos', não estando dispostos, pelo menos na maioria dos casos, a envolverem-se no trabalho de pregação das boas novas do reino de Cristo.88 De fato, o principal pecado deles tinha sido a sua recusa em trabalhar seriamente de livre vontade sob o Juiz Joseph Franklin Rutherford.

Durante algum tempo, as comissões de serviço que substituíram os anciãos e diáconos foram eleitas pelas congregações locais. Mas em 1938 todos os seus representantes ou 'servos', como eram então chamados, passaram a ser nomeados pela Sociedade Torre de Vigia. A democracia congregacional foi substituída pelo governo teocrático. Os Estudantes da Bíblia, agora Testemunhas de Jeová, tinham-se tornado um exército de evangelizadores. Até os nomes que usavam eram de natureza militar. Já não se deviam mais referir às suas congregações como 'classes', 'eclésias' ou 'igrejas' como tinham feito durante tanto tempo; agora eram 'companhias' sob 'servos de companhia', os sucessores dos diretores de serviço. Os colportores eram agora evangelizadores a tempo inteiro conhecidos como 'pioneiros', muitos dos quais tinham servido como 'atiradores de elite' numa guerra espiritual contra o Diabo e o seu sistema.

Alienação Social Crescente

Outras mudanças significativas sob a presidência de Rutherford contribuíram para tornar os Estudantes da Bíblia/Testemunhas de Jeová sociologicamente mais sectários ou, como Werner Cohn os descreveu, mais 'proletários' no sentido Marxista original desse termo.89 Com efeito, eles tornaram-se mais completamente isolados e alienados do resto da sociedade num sentido psicológico, uma comunidade que vive e trabalha em, mas não comunga de, sociedades mais amplas.

O Juiz Rutherford passou a achar, por exemplo, que seriam ressuscitadas menos pessoas do que Russell pensava. O Pastor, um ser humano geralmente caloroso e bondoso, não tinha acreditado na salvação universal, mas tinha chegado perto disso. Mas para choque de muitos Estudantes da Bíblia, em 1923 The Watch Tower [A Sentinela] declarou diretamente que não havia esperança para o clero da cristandade.90 Mais tarde, Estudantes da Bíblia dissidentes foram classificados como 'servos iníquos' e 'o homem da perdição' e por isso foram condenados à destruição eterna.91 No fim da década de 1930, a literatura da Sociedade estava a ensinar, em nítido contraste com as opiniões de Russell, que Adão e Eva, Caim e os habitantes de Sodoma e Gomorra, Salomão, os escribas e fariseus e uma legião de outros tinham perecido eternamente. Além disso, a literatura passou a defender que qualquer pessoa que rejeitasse a mensagem das Testemunhas de Jeová depois de 1918, e todas as crianças pequenas incluindo bebês de colo que morressem no Armagedom não teriam esperança de ressurreição.92 E embora Estudantes da Bíblia ao estilo antigo que continuavam em associação com a Sociedade muitas vezes se recusassem discretamente a aceitar tais ensinos, os novos convertidos, que substituíram gradualmente e em breve superaram em número o punhado de leais à Torre de Vigia dos dias de Russell, aceitavam-nos.

Nas edições da The Watch Tower [A Sentinela] de 1.º de junho e 15 de junho de 1929, Rutherford também introduziu uma nova exegese de Romanos 13:1-7, que fez com que as Testemunhas encarassem o Estado secular como demoníaco e virtualmente sem aspectos redentores. Em 1932, ele e a Sociedade abandonaram uma longa tradição que tinha ensinado que judeus naturais e o Sionismo tinham um papel especial no plano divino de Jeová; agora as próprias Testemunhas deviam ser encaradas como o único Israel de Deus.93 E em 1935 as Testemunhas, encorajadas pelas ações dos seus irmãos na Alemanha e por um discurso do Juiz Rutherford, tomaram uma posição mais forte contra a saudação de bandeiras nacionais e levantar-se quando eram entoados hinos nacionais.94

Rutherford e aqueles que lhe eram próximos também tinham uma influência cada vez maior sobre as Testemunhas de outras maneiras. O Juiz era um homem muito tendencioso e com preconceitos profundos. Assim, como um populista à maneira antiga, ele tinha uma muito alardeada simpatia pelos pobres e, seguindo as pisadas de Russell, geralmente manifestava um senso de tolerância racial. No entanto, curiosamente, a sua aparente simpatia para com os judeus e negros era muitas vezes misturada com uma intolerância branca, [típica] do sul da América, em relação a esses grupos. Por exemplo, enquanto dava um discurso sobre o regresso dos judeus à Palestina na profecia, num congresso dos Estudantes da Bíblia em Winnipeg, Manitoba, no início da década de 1920, ele disse: 'Estou a falar do judeu da Palestina, não estou a falar do pequeno indivíduo de nariz curvo e ombros inclinados que fica de pé nas esquinas das ruas tentando extorquir-lhe todos os tostões que você tem.'95 No que diz respeito às mulheres, ele era completamente misógino. Ele viveu afastado da esposa durante anos e odiava feministas. Assim, ele até chegou ao extremo de sugerir que era moralmente errado para homens cristãos levantar o chapéu às senhoras, levantar-se quando elas entravam numa sala, ou mostrar qualquer deferência particular a mulheres. Ele encarava o Dia da Mãe como uma conspiração feminista. Mas talvez mais espantoso ainda, ele citou abertamente a descrição de Kipling de uma mulher como 'um novelo de cabelo e um saco de ossos.'96 Como seria de esperar, muitas Testemunhas, particularmente trabalhadores das classes baixas, de colarinho azul, adotaram os valores do juiz, explícita ou implicitamente.

O juiz por vezes também era uma pessoa austera e a austeridade tornou-se um regra da vida das Testemunhas. Natal, festas de aniversário e outros costumes populares foram descritos como sendo de origem pagã, anti-cristãos, e consequentemente não deviam ser celebrados ou praticados.97 Durante algum tempo até foram proibidos os cânticos nas congregações.98 Barbas, freqüentemente usadas por muitos Estudantes da Bíblia em imitação do Pastor Russell, foram proibidas nos escritórios e tipografias da Torre de Vigia em todo o mundo.99 A barba era encarada como um sinal de presunção, embora muitas Testemunhas mais antigas ignorassem Rutherford neste assunto e continuassem a usar barba.

Rutherford não era a única influência da comunidade dos Estudantes da Bíblia/Testemunhas de Jeová nas décadas de 1920 e 1930, embora certamente fosse a mais importante. Clayton Woodworth era uma segunda influência, e por isso também merece alguma descrição. Conforme observado anteriormente, Woodworth era mais do que apenas um pouco excêntrico. Como conseqüência disso, ele haveria de impor às Testemunhas algumas idéias muito pouco ortodoxas através das páginas da The Golden Age [A Idade de Ouro], da qual era editor. Entre outras coisas, ele odiava a Associação Médica Americana, negava a teoria das doenças provocadas por germes, atacava constantemente as vacinas contra a varíola como sendo um costume nojento de injetar pus animal no sistema humano, e levou a cabo uma vendetta contra a indústria do alumínio. Os utensílios de alumínio, segundo Woodworth, eram venenosos.100 Assim, as Testemunhas receberam dele mais algumas atitudes e práticas estranhas. Muitas vezes, quando ficavam mal dispostas depois de comerem num restaurante ou café, as famílias de Testemunhas atribuíam a sua indisposição aos utensílios de alumínio em vez de a uma intoxicação alimentar, embora esta última hipótese fosse mais provavelmente a causa.

Talvez a atividade mais extrema de Woodworth tenha sido a criação de um novo calendário para as Testemunhas de Jeová. Nas edições da The Golden Age [A Idade de Ouro] de 13 de março, 27 de março e 10 de abril de 1935, ele publicou um artigo em três partes intitulado 'The Second Hand in the Timepiece of God'. Com o seu zelo típico, ele derramou vitríolo verbal sobre o clero da Igreja de Roma e passou a descrever praticamente todos os calendários em uso corrente como sendo do Diabo. Depois de uma discussão muito enrolada sobre vários textos bíblicos e

[imagem]
O Ano de Resgate de Jeová (da The Golden Age [A Idade de Ouro] de 13 de março de 1935, p. 381)

cálculos astronômicos, ele apresentou o seu novo calendário 'teocrático' na página 381 da The Golden Age [A Idade de Ouro] de 13 de março. Todos os nomes dos meses e dos dias da semana eram diferentes daqueles normalmente usados. Além disso, o novo calendário começava com a crucificação em vez de começar com o nascimento de Cristo, e os novos anos deviam começar na primavera. Finalmente, o número de dias nos novos meses foi um pouco modificado. Felizmente, o Juiz Rutherford teve o bom senso de nunca permitir que o calendário teocrático de Woodworth fosse usado.

O Crescimento da Comunidade dos Estudantes da Bíblia/Testemunhas

Durante a maior parte da administração de Rutherford, o crescimento do número de Estudantes da Bíblia/Testemunhas foi surpreendentemente lento, particularmente se considerarmos a grande quantidade de literatura da Torre de Vigia distribuída, o número de sermões de Rutherford pregados através da rádio, e o número de horas gastas na realização de visitas domiciliares por zelosos 'publicadores do reino'. Praticamente não houve crescimento permanente antes de 1928, e durante a década seguinte o número de publicadores ou pregadores ativos aumentou apenas 2,97% por ano para um total de 59.047.101 Em 1938 apenas 69.345 assistiram ao Memorial anual da Ceia do Senhor.102 Portanto, em termos numéricos, até esta altura dificilmente se poderia dizer que as Testemunhas de Jeová se tinham tornado num grande sucesso, e a grande campanha de proselitismo de Rutherford provavelmente alienou muito mais membros do público do que atraiu.

Um dos principais fatores inibindo um crescimento mais rápido era que, ao mesmo tempo que estavam sendo feitos numerosos novos convertidos, quase tantos Estudantes da Bíblia de longa data estavam cortando a sua associação com a Sociedade.103 Mudanças doutrinais contínuas e a luta entre o Juiz Rutherford e os anciãos levou muitos mais a afastarem-se; e quando em 1929 e 1930 um movimento mais ativo, tradicionalmente 'Russellita', o Dawn Bible Students Association, começou a surgir, muitos juntaram-se-lhes.104 Depois disso, quando as Testemunhas de Jeová procuravam a associação mais liberal e tradicional dos Estudantes da Bíblia, tendiam a gravitar para esse grupo.

No entanto, lentamente, as Testemunhas de Jeová começaram a expandir-se e nos últimos anos da vida do juiz milhares de novos convertidos juntaram-se-lhes. Vários fatores, todos merecendo alguma análise, foram responsáveis por esse crescimento. Estes incluem a organização melhorada sob governo teocrático, a doutrina da vindicação do nome de Jeová, a nova doutrina da 'grande multidão' e condições graves em todo o mundo, provocadas pela Depressão, a ascensão do Fascismo e o eclodir da Segunda Guerra Mundial. Finalmente, a firme fidelidade das Testemunhas durante perseguição terrível nas décadas de 1930 e 1940 deu-lhes uma proeminência e simpatia que atraiu muita gente a eles.

O governo teocrático mudou a natureza da comunidade das Testemunhas. Não só os servos de companhia e os seus assistentes eram nomeados diretamente pela Sociedade, mas as companhias locais eram organizadas em 'zonas' sob 'servos de zona' que as visitavam regularmente para encorajar o trabalho de pregação e 'manter a unidade de ação'. Eram reunidas cerca de vinte congregações numa área particular para formar uma zona e de tempos a tempos eram realizados congressos de zona. As zonas eram por sua vez organizadas em regiões sob servos regionais que visitavam as zonas na época dos congressos. Em 1.º de outubro de 1938, os Estados Unidos estavam divididos em onze regiões que estavam subdivididas em 148 zonas.105 Assim, o governo teocrático compreendia a criação de um sistema plenamente desenvolvido de governação teocrática com 'servos' que detinham exatamente tanta autoridade entre as Testemunhas de Jeová como os arcebispos e bispos entre os Católicos Romanos. E estes servos enfatizavam, até um ponto como nunca antes tinha sido feito, que se uma pessoa queria ser aprovada pela Sociedade, e consequentemente por Jeová, ela tinha de pregar.

Em 1938 eram poucos os Estudantes da Bíblia de mentalidade mais independente que ainda permaneciam em associação com a Sociedade Torre de Vigia. Opor-se à teocracia de qualquer modo significava ser rotulado de 'perturbador' e evitado. Com poucas excepções, isto significava que a maioria das Testemunhas de Jeová apoiavam completamente a pregação de casa em casa e tudo o resto publicado na The Watchtower [A Sentinela]. Conforme uma Testemunha idosa da Califórnia disse: 'Se The Watchtower [A Sentinela] dissesse que a lua era feita de queijo verde, eu acreditaria nisso.' Felizmente, The Watchtower [A Sentinela] não foi tão longe; no entanto, quando a Sociedade instruía as Testemunhas a levar a cabo uma campanha de evangelização sob todas e quaisquer circunstâncias, elas estavam prontas a obedecer até à própria morte. Não admira que os Nazis as considerassem um movimento político perigoso e rival.106

A Vindicação do Nome de Jeová

Um fator importante por detrás desse zelo era a doutrina da vindicação do nome de Jeová, uma doutrina que ainda é ensinada pelas Testemunhas de Jeová hoje. Sob Russell, a doutrina central dos Estudantes da Bíblia tinha sido o resgate expiatório de Cristo que era visto como a expressão do amor de Deus pela Humanidade. Consequentemente, para Russell e para os Estudantes da Bíblia dos seus dias, o Novo Testamento era encarado como sendo mais importante do que o Velho Testamento. Embora às vezes enfatizassem a importância da ira de Deus, não era uma doutrina primária para eles. Sob Rutherford, tudo isso mudou. Escrevendo na página 320 do livro Jehovah [Jeová], publicado em 1934, ele declarou taxativamente: 'Deus providenciou que a morte de Cristo Jesus, o seu amado filho, fornecesse o resgate ou preço redentor para o homem; mas essa bondade e amor para com a humanidade são secundários em relação à vindicação do nome de Jeová.' O juiz enfatizou como, sendo fiel à sua comissão, as testemunhas de Deus ao longo da história tinham tido uma parte na vindicação do nome divino. Mas a vindicação definitiva do Todo-Poderoso viria no Armagedom quando os iníquos fossem destruídos. Usando interpretação alegórica, Rutherford argumentou que ao trazer vingança sobre os iníquos nos dias do antigo Israel, Jeová estava simplesmente prefigurando o que faria nos últimos dias deste mundo iníquo. Por isso tornou-se da máxima importância que os homens escolhessem entre juntar-se a Jeová, a Cristo e à Teocracia, ou desaparecer junto com o Diabo e o seu sistema na batalha do grande dia de Deus, o Todo-Poderoso.

Significativamente, a doutrina da vindicação do nome de Jeová era de muitas maneiras como a doutrina de João Calvino sobre a majestade de Deus. Igualmente significativo, foi sem dúvida um dos principais fatores no desenvolvimento de um zelo ardente, quase fanático, nas Testemunhas do século vinte exatamente como o ensino de Calvino tinha feito entre os seus seguidores no século dezasseis. Isso significava que, tal como os calvinistas dessa era, as Testemunhas tornaram-se cada vez mais intolerantes para com tudo e todos que não estivessem em harmonia com a nova nação de Deus, a Teocracia, como eles a viam.

O Ataque à Religião

Ligada à doutrina da vindicação do nome de Jeová estava uma campanha rancorosa de invectivas contra aqueles que as Testemunhas encaravam como inimigos de Deus. O juiz Rutherford e os seus associados próximos nunca esqueceram o trauma de 1918 e 1919. Assim, até à sua morte em 1942, ele lançou uma série se ataques ao comércio, política e religião -- 'os três principais instrumentos do Diabo'. No que diz respeito ao capitalismo, o juiz odiava-o tal como Russell antes dele, e é de certo modo compreensível que os Estudantes da Bíblia e as Testemunhas da década de 1930 tenham sido ocasionalmente acusadas de simpatias marxistas, ou pelo menos socialistas.107 O juiz, no entanto, não tinha os políticos de esquerda em mais alta conta do que quaisquer outros; ele afirmava que seriam todos destruídos no Armagedom. Porém, nem o comércio nem a política receberam o abuso verbal que Rutherford, Woodworth e as Testemunhas lançaram sobre as igrejas e, em particular, sobre o clero.

Rutherford, corretamente, culpou membros do clero pela sua detenção em 1918 e, embora ele certamente fosse contrário ao protestantismo e judaísmo, guardou os epítetos da sua escolha para os padres e hierarquia da Igreja de Roma. Por exemplo, num estilo típico, no livro Enemies [Inimigos], o juiz declarou: 'Todas as organização na terra que estão em oposição a Deus e ao seu reino, por conseguinte, tomam necessariamente o nome de "Babilônia" e "meretriz", e esses nomes aplicam-se especificamente à organização religiosa que ocupa a liderança, a igreja Católica Romana, que afirma ser a mãe da assim chamada "religião cristã". Essa poderosa organização religiosa, predita nas Escrituras, usa o método das meretrizes para induzir políticos e traficantes comerciais e outros a caírem nos seus braços e renderem-se aos supostos charmes dela.'108

Os ataques de Rutherford tornaram-se cada vez mais vitriólicos, particularmente à medida que as Testemunhas ficaram sob terrível perseguição na Alemanha Nazi, Itália, Grã-Bretanha, Canadá e Estados Unidos. Depois ele até passou a usar o termo 'religião' para significar religião falsa, que condenou publicamente como 'um laço e uma extorsão'.109 E, à medida que as jeremíadas de Rutherford foram ficando mais severas, as Testemunhas derivaram mais deleite em publicá-las.

Quando em meados da década de 1930 o juiz foi obrigado a sair das ondas de rádio em resultado da pressão tanto da comunidade comercial como das igrejas no Canadá e nos Estados Unidos,110 a Sociedade Torre de Vigia produziu discos de fonógrafo com as suas denúncias tonitruantes, que eram tocadas em fonógrafos portáteis levados de casa em casa por Testemunhas de Jeová voluntárias. Noutros casos, essas mesmas Testemunhas tocavam os discursos de Rutherford através de altifalantes para comunidades inteiras, muitas vezes de católicos irados. Num caso, na província do Quebec, elas chegaram ao extremo de construir um carro sonoro com proteções de chapa -- do qual ainda existem várias imagens -- a partir do qual podiam transmitir condenações à Igreja de Roma para turbas hostis em duas línguas.

Noutros casos, centenas de publicadores das Testemunhas invadiram vilas e cidades hostis, muitas vezes em violação de leis locais contra vendedores ambulantes e em face de ameaças de prisões em massa.111 Por fim, em demonstrações tanto de coragem como do seu desprezo pelo 'mundo de Satanás', um grande número delas, jovens e idosas, homens e mulheres, marchavam através de cidades e vilas do mundo de língua inglesa no que eram chamadas 'marchas de informação'. Espalhados em longas filas, eles caminhavam através de passeios movimentados, carregando sinais e placares com slogans cunhados pelo Juiz Rutherford, como 'Religião É Laço e Extorsão' e 'Sirva Deus e Cristo o Rei'.112

Naturalmente, muitos achavam o comportamento das Testemunhas ofensivo e bizarro. No entanto, os seus ataques constantes ao comércio, política e religião atraíram muitos. Durante a década de 1920 e ao longo da Depressão, líderes sindicais muitas vezes elogiavam o Juiz Rutherford devido aos ataques dele ao alto comércio.113 Trabalhistas, políticos liberais e socialistas admiravam as suas denúncias igualmente severas de Mussolini, Hitler, Franco e movimentos de extrema direita em todo o mundo. Milhares de protestantes e anti-clericais concordavam com tudo o que as Testemunhas tinham a dizer sobre a hierarquia Católica Romana e admiravam a coragem delas ao dize-lo. Finalmente, como as Testemunhas de Jeová muitas vezes buscavam abertamente o martírio e o encaravam com bravura, até os seus inimigos começaram a desenvolver um grau de respeito por elas.

A Grande Multidão

Provavelmente o fator mais significativo para o crescimento mais rápido da comunidade das Testemunhas durante os últimos anos da vida de Rutherford foi a nova doutrina da 'grande multidão'. Quase desde o princípio do seu ministério, o Pastor Russell tinha ensinado que os Estudantes da Bíblia eram membros da classe eleita dos 144.000 mencionados em Revelação 7 e 14, que reinariam como reis-sacerdotes com Cristo durante o milênio. Além disso, ele enfatizou que a vasta maioria da Humanidade herdaria vida perfeita através da ressurreição num paraíso restaurado -- a terra. Mas além dos 'eleitos' e da maioria dos humanos salvos, The Watch Tower [A Sentinela] tinha ensinado que havia um terceiro grupo, a 'grande multidão' de Revelação 7:9, que receberia vida celestial num plano secundário. The Watch Tower [A Sentinela] também explicou que haveria uma 'classe de ovelhas' mencionada em Mateus 25:31-46, que seria separada dos 'cabritos' no tempo do fim. Em 1932 Rutherford declarou que essas 'ovelhas' eram retratadas por Jonadabe, líder recabita da antigüidade que se tinha juntado ao Rei Jeú de Israel quando este destruiu os sacerdotes de Baal da Rainha Jezabel.114

Esses conceitos eram complexos e, mais importante, significavam que as Testemunhas viam o seu trabalho de pregação como dirigido apenas ao ajuntamento dos 144.000 eleitos de Deus. O próprio Jeová lidaria com as outras classes da Humanidade no seu próprio tempo devido. Tudo isso mudou dramaticamente quando, na primavera de 1935, o presidente da Sociedade Torre de Vigia fez um discurso em Washington, DC, no qual argumentou que a 'grande multidão', as 'ovelhas' de Mateus 25 e os 'Jonadabes' eram todos uma classe que receberia vida eterna na terra como recompensa pela sua fé e obediência ao reino de Cristo.115 Em resultado disso, as Testemunhas sentiam que tinham de reunir um grande número de pessoas para a organização de Deus de modo que pudessem ser salvas da iminente batalha do Armagedom, para a vida numa nova terra. Em vez de simplesmente pregar para reunir os eleitos e anunciar o vindouro fim do mundo, elas iniciaram um esforço muito mais concentrado para ganhar conversos.

Vida Pessoal e Últimos Dias de Rutherford

Algum tempo depois de se ter tornado presidente da Sociedade Torre de Vigia, o Juiz Rutherford e a sua esposa, Mary, estavam discretamente separados. Embora ela seja geralmente descrita por Testemunhas mais antigas como 'uma semi-inválida que não podia render ao juiz as suas obrigações maritais', a separação deles não se ficou a dever só à falta de saúde dela ou ao trabalho dele. Eles estavam alienados e obviamente tinham muita amargura entre si, embora o motivo exato não seja claro. Talvez fatores que causaram contendas entre eles tenham sido o temperamento colérico e convencido de Rutherford e o seu evidente caso sério de alcoolismo.

Embora as Testemunhas de Jeová tenham feito tudo o que era possível para esconder relatos dos hábitos de bebida do juiz, estes são simplesmente demasiado notórios para poderem ser negados. Ex-trabalhadores da sede da Torre de Vigia em Nova Iorque contam histórias sobre os seus estados de embriaguez. Outros contam histórias de como por vezes era difícil fazê-lo chegar à tribuna para dar discursos nos congressos, devido à sua embriaguez. Em San Diego, Califórnia, onde ele passou os verões desde 1930 até à sua morte, uma senhora idosa ainda fala de como lhe vendeu grandes quantidades de bebidas alcoólicas quando ele vinha comprar medicamentos à farmácia do marido dela. Mas talvez o relato mais revelador dos hábitos de bebida de Rutherford seja aquele que apareceu numa carta aberta que lhe foi dirigida pelo anterior superintendente da filial da Torre de Vigia no Canadá, Walter Salter.

Durante anos, Salter foi um amigo e confidente próximo do juiz, mas em 1936 ele afastou-se do juiz devido a divergências doutrinais e foi desassociado. Em 1 de abril de 1937 ele publicou a carta mencionada anteriormente, que era uma violenta acusação pessoal contra Rutherford e que, nos seus contornos gerais, é bastante exata. Assim, Salter afirmou que tinha comprado 'whisky a 60 dólares cada caixa' para o presidente da Torre de Vigia 'e caixas de aguardente e outras bebidas alcoólicas, além de caixas de cerveja sem conta,' tudo com o dinheiro da Sociedade. Para que ninguém pensasse que estas bebidas eram para outros, o ex-superintendente da filial no Canadá declarou: 'Uma garrafa ou duas de bebidas alcoólicas não chegava; era para o PRESIDENTE e nada era demasiado bom para o PRESIDENTE.' Depois de descrever o estilo de vida faustoso de Rutherford, Salter disse com amarga ironia: 'E, ó Senhor, ele [Rutherford] é tão corajoso e a fé que tem em Vós é tão grande que se esconde atrás de quatro paredes, ou rodeia-se literalmente de guarda-costas armados e põe-se a clamar os seus sonhos ... e manda-nos de porta em porta para enfrentar o inimigo enquanto ele vai de "bebida em bebida" e diz-nos que se não formos de porta em porta seremos destruídos.'

No que diz respeito a acomodações e confortos pessoais, Salter relata que Rutherford vivia como um príncipe ou barão da indústria. Ele alugou um apartamento com mobílias luxuosas em Nova Iorque, que segundo a estimativa de Salter valia pelo menos 10.000 dólares por ano, durante a Depressão. Além disso, o presidente da Torre de Vigia tinha uma 'residência palacial' em Staten Island, 'camuflada' como se fosse essencial para a estação de rádio da Sociedade, a WBBR. Também em Staten Island, ele mantinha uma residência pequena, numa zona remota da floresta, onde se podia isolar do mundo. Além disso, eram mantidos para ele alojamentos dispendiosos em vários outros sítios incluindo Londres e, antes da subida dos Nazis ao poder, em Magdeburgo [na Alemanha]. E como se tudo isso não fosse ainda suficiente, devido à sua saúde ele começou a construir Bete-Sarim em 1929, uma mansão em San Diego [na Califórnia] que se tornaria a sua casa de inverno.

Estranhamente, Rutherford encontrou uma desculpa doutrinal para construir Bete-Sarim na qual, pelo menos em parte, ele pode ter mesmo acreditado. Segundo a exegese de Sociedade sobre o Salmo 45:16 (Versão Rei Jaime) -- 'Em vez de teus pais haverá teus filhos, a quem poderás fazer príncipes em toda a terra' -- Cristo ressuscitaria Abraão, Isaque, Jacó, Davi e muitos outros servos de Jeová pré-cristãos para governar a Humanidade durante o milênio. Além disso, tinha sido dito a Daniel, também um destes 'notáveis da antigüidade', que ele estaria na sua herança 'no fim dos dias', e a Sociedade Torre de Vigia ensinou que isto seria antes do Armagedom. O Juiz Rutherford e a Sociedade concluíram assim que esses homens fiéis pré-cristãos podiam voltar a qualquer momento nos poucos anos ou meses seguintes. De fato, muitas Testemunhas de Jeová comuns freqüentemente esperavam que os 'príncipes' ressuscitados estivessem presentes no próximo grande congresso da Torre de Vigia. Assim, quando foi supostamente doado ao juiz o dinheiro para construir Bete-Sarim numa propriedade de cem acres em San Diego, ele 'humildemente' fez a escritura para si em nome de Davi e dos outros 'príncipes' que em breve precisariam de um lugar agradável para residir.116 Isso, porém, não o impediu de viver ali com um séquito bastante numeroso de aderentes e com um dos seus dois Cadillacs de dezasseis cilindros que, segundo o folclore popular das Testemunhas, lhe tinha sido dado 'como o maior homem na terra' por um crente abastado de Iowa.

Apesar de tudo isto, de algum modo estranho o Juiz Joseph Franklin Rutherford continuava a levar a sério a si mesmo e às doutrinas que proclamava. Consequentemente, quando a Segunda Guerra Mundial veio, parecia-lhe ser o cumprimento de profecias apocalípticas, e ele ficou convencido que a guerra levaria diretamente à destruição tanto dos demônios como da Humanidade iníqua no Armagedom. Assim, no último ano da sua vida, à medida que ele mostrava sinais inconfundíveis de ser um homem muito doente morrendo de cancro, a partir de Bete-Sarim ele começou a desmantelar parte da estrutura organizacional que tinha estabelecido pouco tempo antes. Em dezembro de 1941 ele descontinuou os cargos de servos regionais e de zona e acabou com o costume de realizar congressos de zona. Nesse tempo ele escreveu: '"O estranho trabalho" do Senhor [o trabalho de pregação pública] está a aproximar-se do fim e requer pressa, com vigilância, sobriedade e oração.'117 Porém, ele insistiu que todas as Testemunhas deviam continuar esse trabalho até Deus mandar parar. 'Com plena determinação de ser obedientes ao Senhor', disse ele, 'que estas palavras do Senhor sejam um slogan orientador: "Esta coisa farei" que é anunciar A TEOCRACIA.'118

Morte e Legado de Rutherford

Rutherford morreu em Bete-Sarim em 8 de janeiro de 1942, depois de uma doença prolongada. No entanto, ele morreu ainda ativo ou, como os seus companheiros Testemunhas relataram, 'combatendo com as suas botas calçadas'.119 Ele tinha expressado o desejo de ser sepultado num desfiladeiro cerca de noventa metros abaixo da Casa dos Príncipes que ele tinha usado e gozado durante muito tempo enquanto aguardava o regresso dos 'notáveis' da antigüidade pré-cristã,120 mas isso não aconteceria. A área não estava projetada para a criação de cemitérios privados e os vizinhos queixaram-se dizendo que sepultar o juiz onde ele tinha pedido diminuiria o valor das suas propriedades. Por isso, funcionários locais recusaram-se a conceder uma autorização de enterro.121 Publicações da Torre de Vigia asseveraram amargamente que este era simplesmente um último ato de despeito da organização do Diabo contra o porta-voz fiel de Jeová que partira,122 e Testemunhas locais levaram a cabo uma prolongada batalha de três meses para honrar o último desejo de Rutherford.

Registos do caso mostram que havia pouca substância para as acusações da Torre de Vigia sobre preconceito religioso,123 e evidência física em Bete-Sarim sugere que os vizinhos tinham alguma razão para preocupação. Em vez de querer sepultar o corpo Rutherford numa simples campa do desfiladeiro, como mais tarde afirmaram, os seus aderentes pessoais mais próximos -- a 'família' de Bete-Sarim -- queriam colocá-lo numa grande cripta de cimento, muito imponente, que começaram a construir quando ele estava a morrer. Consequentemente, os vizinhos sem dúvida receavam que o prospectivo túmulo de Rutherford se poderia muito bem tornar num monumento que seria visitado por Testemunhas de Jeová de todo o lado.

Claro que isso não aconteceu. Quando funcionários do Condado de San Diego finalmente recusaram autorização para que o Juiz Rutherford fosse enterrado em Bete-Sarim, os seus restos mortais foram levados para Rossville, Nova Iorque, e colocados ali,124 e foram rapidamente esquecidos por todos exceto uns poucos amigos próximos. Os registos da tentativa de enterrá-lo em Bete-Sarim mostram que nem os funcionários da Torre de Vigia nem a sua viúva e filho, Malcolm, pareciam muito preocupados com a sua última morada, pois eles foram notórios nas audições sobre o assunto pela sua ausência. Além disso, como o próprio juiz tinha ensinado as Testemunhas a serem leais à organização de Jeová, a teocracia, em vez de a qualquer homem, eles foram rápidos em dar a sua completa lealdade aos seus sucessores no Betel de Brooklyn. Assim, hoje apenas um punhado de Testemunhas, que têm cerca de sessenta anos ou mais, sabem bastante sobre o homem que reformulou o seu movimento, e são ainda menos as que sabem que Bete-Sarim e a cripta de cimento inacabada de Rutherford ainda existem como monumentos a ele -- embora a Casa dos Príncipes já não seja mantida para todos os homens justos desde Abel até João, o Batizador.

No entanto, o verdadeiro monumento do Juiz Rutherford não é uma cripta de cimento; é o movimento que, depois da morte do Pastor Russell, ele pastoreou através dos dias negros da Primeira Guerra Mundial e reformulou depois. Num sentido real, foi ele, em vez do Pastor, quem desenvolveu as Testemunhas de Jeová no que elas são hoje -- um fato continuamente enfatizado pelos grupos de Estudantes da Bíblia anti-Torre de Vigia. Embora sem dúvida ele fosse uma pessoa dura, implacável e freqüentemente desagradável cujo raciocínio era dominado muito mais por casuística do que os seus companheiros Testemunhas gostariam de admitir, é provável que só alguém como ele pudesse ter criado a base para fazer das Testemunhas de Jeová o movimento sectário importante, mundial, que são hoje. Pois sob o seu exterior severo ele parece ter acreditado, tal como Russell antes dele, que tinha uma missão divinamente designada. Apesar dos cismas dos Estudantes da Bíblia, perseguição externa, prisão pessoal, e o falhanço do fim do mundo em 1918 ou 1925, ele conseguiu manter o controle sobre um corpo de homens e mulheres zelosos que continuaram a aguardar a aproximação da revelação de Cristo e a batalha do Armagedom. E foi a sua dureza e capacidades organizacionais, por vezes impopulares, que acabariam por dar às Testemunhas de Jeová a personalidade férrea que precisavam para passar através da perseguição das décadas de 1930 e 1940.

Conforme William Whalen notou, o Juiz Joseph F. Rutherford foi para o Pastor Charles T. Russell o que Brigham Young foi para o profeta Mórmon Joseph Smith.125 Embora Smith e Russell fossem líderes religiosos capazes, em grande medida ambos eram visionários muito ingênuos que podiam -- através do uso de imaginação fértil -- enganar tanto a si mesmos como a outros. Mas Young e Rutherford eram pragmáticos duros que deram um grau de permanência aos movimentos que dominaram. Embora o juiz tivesse pouco tempo ou interesse numa esposa, e muito menos num harém, ainda assim ele parecia-se com o severo Mórmon Lião do Senhor em muitos aspectos -- embora provavelmente nem as Testemunhas de Jeová nem os Mórmons apreciem a comparação.


Notas

1 A maior parte da informação sobre Rutherford vem de Marley Cole, Jehovah's Witnesses: The New World Society [Testemunhas de Jeová: A Sociedade do Novo Mundo] (Nova Iorque: Vantage Press, 1955); Timothy White, A People for His Name [Um Povo Para o Seu Nome] (Nova Iorque: Vantage Press, 1967); A. H. Macmillan, Faith on the March [A Fé em Marcha] (Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, 1957); Jehovah's Witnesses in the Divine Purpose [As Testemunhas de Jeová no Propósito Divino] (Brooklyn, NY: Watchtower Bible and Tract Society, 1959); e ficheiros do Departamento de Justiça sobre o caso United States v. Rutherford et al. nos U. S. National Archives em Washington, DC.

2 Rutherford de fato fez campanha a favor de Bryan em 1896.

3 Página 68.

4 Em 27 de abril de 1926, George H. Fisher escreveu uma carta para W. Nieman, de Magdeburg, Alemanha, acusando Rutherford de ter comparecido ao Al Jolson's Winter Theater para ver a Edição Parisiense do então notório espetáculo 'Artistas e Modelos'. Fisher queria trazer Rutherford, como ancião por inerência de todas as eclésias de Estudantes da Bíblia, perante as igrejas individuais para disciplina. Fisher alegou que tinha as testemunhas necessárias para fazer isso. Mas em julho do mesmo ano Fisher morreu e o assunto nunca foi mais adiante. Nieman, porém, publicou a carta de Fisher e uma análise das suas acusações num prospecto intitulado 'Irmão George H. Fisher'. A fraca resposta de Rutherford à acusação de Fisher foi que estava demasiado ocupado no trabalho do Senhor para se incomodar em responder a tal criticismo e, de qualquer modo, ele nunca tinha visto Al Jolson na sua vida e não sabia como era o aspecto dele. Veja The Golden Age [A Idade de Ouro] (4 de maio de 1927), p. 505, 506.

5 WT, 1916, reimpressões, pp. 5999, 6000.

6 Ibid.

7 Ibid, 1917, reimpressões, p. 6035.

8 Para mais detalhes, veja a página 51.

9 Macmillan, pp. 75, 76. Anuário das Testemunhas de Jeová de 1974, pp. 101-106.

10 Anuário de 1974, p. 101.

11 Ibid, pp. 101, 102.

12 Ibid, pp. 102, 103.

13 Ibid, pp. 103-105.

14 Ibid, p. 106; Anuário de 1976, p. 89.

15 Macmillan, pp. 76, 77; Divine Purpose [Propósito Divino], p. 70; Anuário de 1976, p. 87.

16 Páginas 91, 92.

17 J. F. Rutherford, Harvest Siftings -- Part I [Peneiramento da Colheita -- Parte I] (Brooklyn, NY: International Bible Students Association, 1917), p. 17.

18 Anuário de 1976, pp. 90, 91.

19 WT, 1906, p. 3825.

20 Divine Purpose [Propósito Divino], pp. 70, 71.

21 Rutherford, Harvest Siftings -- Part II [Peneiramento da Colheita -- Parte II]. Para outros relatos deste evento, veja A. N. Pierson, J. D. Wright, A. I. Ritchie, I. F. Hoskins, e R. H. Hirsh, Light after Darkness [Luz Após as Trevas] (Brooklyn, NY: impressão privada, 1917), p. 9; Paul S. L. Johnson, Merarism (Filadélfia: Paul S. L. Johnson, 1938), pp. 73-84.

22 Macmillan, p. 81.

23 Veja os próprios comentários de Johnson em Harvest Siftings Reviewed [Análise do Peneiramento da Colheita] (Brooklyn, NY: impressão privada, 1917), p. 8, onde ele diz: 'Parecia-me que as minhas experiências na Grã-Bretanha eram retratadas pelas de Neemias, Esdras e Mordecai (o Irmão Hemery acreditava que ele anti-tipificava Eliasibe e Hanani em Neemias): que as minhas credenciais estavam em Esdras 7:11-26 e simbolizadas em Ester 8:2, 15. Concluí que eu era privilegiado para me tornar o mordomo e o sucessor do Irmão Russell.'

Outros além de Rutherford pensaram que Johnson estava mentalmente doente. Francis H. McGee, um advogado que era Estudante da Bíblia e que apoiou os quatro diretores demitidos, certamente pensava isso. Numa carta aberta escrita para os quatro em 15 de agosto de 1917, que foi publicada em Light after Darkness [Luz Após as Trevas], ele tornou isso muito claro. Veja a página 18.

24 Johnson, Harvest Siftings Reviewed [Análise do Peneiramento da Colheita], pp. 83, 84; Pierson et al., pp. 5, 6; Rutherford, Harvest Siftings -- Part I [Peneiramento da Colheita -- Parte I], p. 10; Alan Rogerson, Millions Now Living Will Never Die [Milhões Que Agora Vivem Nunca Morrerão: Um Estudo Sobre as Testemunhas de Jeová] (Londres: Constable and Co., Ltd. 1969), pp. 33, 34.

25 Johnson, Harvest Siftings Reviewed [Análise do Peneiramento da Colheita], pp. 82, 83. Pierson et al., pp. 3, 4.

26 Rutherford, Harvest Siftings -- Part I [Peneiramento da Colheita -- Parte I], p. 20.

27 Ibid, p. 16.

28 Veja 'Vice-President's Statement against the Management in August' ['As Declarações do Vice-Presidente contra a Administração em Agosto'] em A. I. Ritchie, J. D. Wright, I. F. Hoskins, e R. H. Hirsh, Facts for Shareholders of the Watch Tower Bible and Tract Society [Factos para os Detentores de Acções da Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados] (Brooklyn, NY: impressão privada, 1917), p. 5.

29 O Testamento de Russell, conforme foi publicado pouco depois da sua morte, pode ser visto na WT, 1916, reimpressões, pp. 5999, 6000.

30 Barbara Grizutti Harrison, Visions of Glory: A History and a Memory of Jehovah's Witnesses [Visões de Glória: Uma História e uma Memória Sobre as Testemunhas de Jeová] (Nova Iorque: Simon and Schuster, 1978), pp. 118-120.

31 William H. Cumberland, 'A History of Jehovah's Witnesses' (dissertação de doutoramento, Universidade de Iowa, 1958), p. 131.

32 Pierson et al., p. 4.

33 Harrison, pp. 118-120.

34 Cumberland, p. 131.

35 Rutherford, Harvest Siftings -- Part I, pp. 19, 20.

36 Ritchie et al., p. 5.

37 Ibid.

38 Rutherford, Harvest Siftings -- Part I, p. 20; Johnson, Harvest Siftings Reviewed, p. 19.

39 Pierson et al., p. 8.

40 Ibid, p. 6; Macmillan, pp. 78-80. Os relatos dados pelos diretores demitidos e por A. H. Macmillan sobre o que aconteceu nesta ocasião estão de acordo exceto quando os diretores demitidos afirmam que o polícia não os obrigou a sair, ao passo que Macmillan afirma o contrário. O relato de Light after Darkness é como se segue: '"Guarda, ponha estes homens na rua!" disse o representante do Presidente. "Vamos, cavalheiros!" disse o polícia para os Diretores. "Guarda, você não tem o direito de nos pôr na rua," respondeu um dos Diretores; "nós somos empregados por esta Sociedade e não estamos a perturbar nada nem ninguém." "É claro que não tenho direito de os pôr na rua!" respondeu o polícia. "Em vez disso, sou eu quem devia sair"; e lá foi ele.'

O relato de Macmillan diz: 'Eu disse "Guarda, estes homens não têm que estar aqui. O lugar deles é na Columbia Heights, 124, e eles estão a perturbar o nosso trabalho aqui. Eles recusaram sair quando lhes ordenamos que saíssem. Agora apenas pensamos em chamar a lei."

'Eles saltaram e começaram a argumentar. O polícia rodopiou o bastão e disse: "Cavalheiros, agora [a situação] está a ficar séria para vocês. Faith e eu conhecemos estes dois, Macmillan e Martin, mas a vocês eu não conheço. Agora é melhor que vocês comecem a ir embora, por receio de que vá haver sarilhos."

'Eles apanharam os seus chapéus e desceram os degraus dois a dois e apressaram-se para Borough Hall para entrarem em contato com um advogado.'

Sejam quais forem os fatos do caso, Macmillan admite que não queria que os diretores obtivessem um quorum para efetuarem negócios e estava decidido a impedi-los de realizar uma reunião de negócios quando Rutherford estava ausente. Macmillan estava por isso a mentir quando disse que os diretores estavam a perturbar o trabalho das pessoas que estavam nos escritórios da rua Hicks. Além disso, ele não menciona que os quatro estavam em Hicks St Chapel quando ele chamou a polícia para os expulsar.

41 Pierson et al., p. 10.

42 'An Open Letter to People of the Lord Throughout the World' [Uma Carta Aberta Para o Povo do Senhor em Todo o Mundo] e 'A Petition to Brother Rutherford and the Four Deposed Directors of the W.T.B. and Tract Society' [Uma Petição ao Irmão Rutherford e aos Quatro Diretores Depostos da Sociedade T.V.B. e Tratados]. Ambos sem data, 1917.

43 WT, 1918, reimpressões, pp. 6197, 6198.

44 Cumberland, p. 118.

45 Ritchie et al., p. 3.

46 WT, 1917, reimpressões, pp. 6184, 6185.

47 Rogerson, p. 39.

48 Para uma discussão destes movimentos desde 1918, veja Alan Rogerson, 'Qui est schismatique?' [Quem é Cismático?], em Social Compass 24:1 (1977), pp. 33-43; e J. Gordon Melton, The Encyclopedia of American Religion (Wilmington, NC: McGrath Publishing Co., 1978), pp. 487-491.

49 Os Standfasters também acreditavam que o trabalho de pregação estava terminado e que a porta para a 'chamada celestial' (para a santidade entre os 144.000) se fechara. O 'Preamble and Resolutions of the Stand Fast Bible Students Association' [Preâmbulo e Resoluções da Associação dos Estudantes da Bíblia Intransigentes] de 1.º de dezembro de 1918 começava com as palavras: 'CONSIDERANDO, Agora que a Páscoa de 1918 já passou, e consequentemente que a "Colheita" terminou, finda a "Era do Evangelho", o "Trigo" reunido, os "Santos" selados e a "Porta" fechada ...' Para mais detalhes sobre o movimento standfast e os grupos que se originaram dele, veja Johnson, Merarism, pp. 731-749.

50 The Golden Age (edição inglesa e canadiana), 29 de setembro de 1920, passim; J. F. Rutherford, Millions Now Living Will Never Die [Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão] (Brooklyn, Nova Iorque: International Bible Students Association, 1920), p. 83; M. James Penton, Jehovah's Witnesses in Canada [Testemunhas de Jeová no Canadá] (Toronto: Macmillan of Canada, 1976), pp. 56-62.

51 Divine Purpose, pp. 74-78.

52 Penton, pp. 69-80.

53 Divine Purpose, pp. 81-83; The Golden Age (29 de setembro de 1920), passim.

54 Divine Purpose, p. 83.

55 Macmillan, pp. 105, 106.

56 Ibid, pp. 107-109.

57 Ibid, pp. 112, 113.

58 WT, 1919, p. 280; Divine Purpose, pp. 89, 90.

59 Russell tinha declarado especificamente: 'Tal como a Sociedade já me jurou que não publicará quaisquer outros periódicos, também será requerido que a Comissão Editorial não escreva nem esteja ligada a quaisquer outras publicações de nenhuma maneira ou grau. O meu objetivo nestes requerimentos é salvaguardar a comissão e a revista de qualquer espírito de ambição ou orgulho ou liderança, e que a verdade possa ser reconhecida e apreciada pelo seu próprio valor, e que o Senhor possa mais particularmente ser reconhecido como a Cabeça da igreja e a Fonte da verdade.' WT, 1916, reimpressões, p. 5999.

60 Divine Purpose, p. 95.

61 Ibid, p. 96.

62 Penton, p. 84.

63 Divine Purpose, pp. 96, 97.

64 Ibid.

65 Ibid.

66 Rutherford, Millions Now Living Will Never Die [Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão], p. 88 [pp. 110, 111 em português].

67 Rutherford, The Harp of God [A Harpa de Deus] (Brooklyn, Nova Iorque: International Bible Students Association, 1921), pp. 230, 231.

68 Páginas 214-236.

69 Página 57.

70 William J. Whalen, Armageddon Around the Corner [Armagedom ao Virar da Esquina] (Nova Iorque: The John Day Company, 1962), p. 66.

71 Cumprir-se-á, Então, o Mistério de Deus (Brooklyn, Nova Iorque: Watchtower Bible and Tract Society, 1971), pp. 209-247, 283-296.

72 Ibid. Veja também Divine Purpose, pp. 101-111; e o Anuário de 1976, pp. 135-139.

73 Anuário de 1976, p. 192.

74 WT, 1925, pp. 67-74.

75 WT, 1938, p. 185. Veja também White, pp. 186-188. Os outros membros da comissão editorial -- W. E. Van Amburgh, J. Hemery, R. H. Barber e C. E. Stewart -- eram todos partidários de Rutherford. Mas quando eles se opuseram às idéias de Rutherford, ele achou que eles estavam a agir de forma contrária à vontade do Senhor. Escrevendo em 1938 na edição da The Watchtower [A Sentinela], citada acima, ele declarou: 'The Watchtower [A Sentinela] de 1.º de março de 1925 publicou o artigo "Nascimento da Nação", significando que o reino tinha começado a funcionar. Uma comissão editorial, providenciada humanamente, nessa altura era suposta controlar a publicação de The Watchtower [A Sentinela], e a maioria da comissão objetou energicamente à publicação do artigo "O Nascimento da Nação", mas pela graça do Senhor, o artigo foi publicado e isso realmente marcou o princípio do fim da comissão editorial, indicando que o Senhor está ele mesmo a governar a organização.'

76 White, pp. 181, 182.

77 Página 7.

78 WT, 1927, pp. 51-57.

79 WT, 1921, p. 329; White, pp. 181, 182.

80 Consolation [Consolação], 4 de setembro de 1940, p. 25.

81 WT, 1931, pp. 278, 279.

82 White, p. 260.

83 Veja o gráfico na página 61.

84 Sem dúvida muito do descontentamento causado por este artigo estava ligado ao falhanço da profecia da Torre de Vigia a respeito de 1925 e ao gradual repúdio dos ensinos de Russell.

85 Para se compreender quão completamente Rutherford e os representantes da Sociedade detestavam os anciãos eleitos, repare na lista de artigos que os atacam sob cabeçalhos tais como 'expostos e impuros' e 'rebeldes' no Watch Tower Publications Index: 1930-1960 [Índice de Publicações da Torre de Vigia: 1930-1960], p. 91.

86 Anuário de 1976, p. 165. Veja também William J. Schnell, Thirty Years a Watchtower Slave [Trinta Anos Escravo da Torre de Vigia] (Grand Rapids, Michigan: Baker Book House, 1956), pp. 56, 57, 59.

87 Isto começou logo em 1923. Divine Purpose, p. 104.

88 Veja por exemplo WT, 1938, pp. 87, 233.

89 Werner Cohn, 'Jehovah's Witnesses as a Proletarian Movement' ['Testemunhas de Jeová enquanto Movimento Proletário'], em The American Scholar, 24 (1955), pp. 281, 282.

90 WT, 1923, pp. 310-313.

91 WT, 1930, pp. 275-281.

92 Consolation [Consolação], 6 de maio de 1936, p. 508; WT, 1938, pp. 133, 313, 314, 326, 376, 377; 1939, p. 170; J. F. Rutherford, Salvation [Salvação] (Brooklyn, Nova Iorque: Watch Tower Bible and Tract Society, 1939), p. 43.

93 J. F. Rutherford, Vindication -- Book II [Vindicação -- Livro II] (Brooklyn, Nova Iorque: Watch Tower Bible and Tract Society, 1932), pp. 257, 258.

94 Divine Purpose, pp. 143, 144.

95 Baseado no relato do meu pai, Levis B. Penton, que estava presente nessa ocasião.

96 Rutherford, Vindication -- Book I [Vindicação -- Livro I, pp. 155-157, 188, 189; The Golden Age [A Idade de Ouro] (20 de junho de 1934), p. 594. A citação Rutherford sobre Kipling foi feita no congresso da Torre de Vigia em St. Louis, Missouri, em 1941, perante milhares de Testemunhas de Jeová. Causa alguma ofensa.

97 Anuário de 1976, pp. 147-149.

98 Só foram restaurados mais de dois anos depois da morte de Rutherford. Divine Purpose, p. 215.

99 Anuário de 1975, pp. 97, 98.

100 White, p. 173. Uma idéia clara sobre as idéias de Woodworth só pode ser obtida examinando a própria The Golden Age [A Idade de Ouro]. Embora White descreva Woodworth como 'inteligente', temos de questionar a estabilidade emocional dele ao publicar as muitas coisas que publicou.

101 Divine Purpose, p. 312.

102 Ibid, p. 313.

103 É impossível dizer exatamente quantos Estudantes da Bíblia dos dias de C. T. Russell depois cortaram a sua associação com a Sociedade, mas o próprio Rutherford admitiu que muitos tinham feito isso. WT, 1930, p. 342. Veja também White, pp. 251-258.

104 When Pastor Russell Died [Quando o Pastor Russell Faleceu], pp. 24-30. Melton, p. 491.

105 Divine Purpose, p. 190.

106 John S. Conway, The Nazi Persecution of the Churches 1933-1945 [A Perseguição Nazi às Igrejas 1933-1945] (Toronto: Ryerson Press, 1968), pp. 195-200.

107 Penton, p. 128.

108 Página 198.

109 Este era o título de outro dos discos de fonógrafo de Rutherford.

110 Divine Purpose, pp. 134-140; Penton, pp. 94-110.

111 Divine Purpose, p. 133.

112 Ibid, p. 145.

113 Penton, pp. 98, 106.

114 Divine Purpose, p. 140.

115 Ibid.

116 The Golden Age [A Idade de Ouro] (19 de março de 1930), pp. 404-407; Herbert H. Stroup, The Jehovah's Witnesses [As Testemunhas de Jeová] (Nova Iorque: Columbia University Press, 1945), p. 42.

117 Divine Purpose, pp. 191, 192.

118 Ibid.

119 Ibid, p. 194.

120 The San Diego Union (12 de janeiro de 1942), p. 2A.

121 The Tribune-Sun (San Diego), 21 de janeiro de 1942, p. 12; The San Diego Union, 21 de janeiro de 1942, p. 3A.

122 WT, 1945, p. 45; Consolation [Consolação], 4 de fevereiro, 17 e 27 de maio, pp. 3-16.

123 Minutes of Regular Meeting of the County Planning Commission [Minutas da Reunião Regular da Comissão de Planeamento do Condado] (San Diego, Califórnia), 24 de janeiro de 1942, pp. 229-235. Meeting of the Board of Supervisors [Reunião da Diretoria de Supervisores] (San Diego, Califórnia), 26 de janeiro de 1942, no. 63. Minutes of Regular Meeting of the County Planning Commission [Minutas da Reunião Regular da Comissão de Planeamento do Condado], 28 de fevereiro de 1942, pp. 240-243. Minutes of the Meeting of the County Planning Commission [Minutas da Reunião da Comissão de Planeamento do Condado], 14 de março de 1942, p. 247.

124 Whalen, p. 67.

125 Ibid.


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