Crisis of Conscience (Crise de Consciência) (Atlanta: Commentary Press, 1992, segunda edição) de Raymond Franz (1922-2010), pp. 198-222.

Capítulo 9: 1975: 'O Tempo Apropriado para Deus Agir'

Raymond Franz


"Não é para vós o saber os tempos ou datas que o Pai colocou sob a sua própria autoridade."
-- Atos 1:7, New International Version.

Durante a segunda metade da presidência de Rutherford a maioria das antigas profecias envolvendo datas, tão ardentemente defendidas na primeira metade, foram gradualmente abandonadas ou revistas.

O começo dos "últimos dias" foi alterado de 1799 para 1914.

A presença de Cristo em 1874 foi também alterada para 1914 (como já tinha sido feito em 1922 com o começo oficial do reinado ativo de Cristo previsto para 1878).

O início da ressurreição foi deslocado de 1878 para 1918.

Por algum tempo afirmou-se até que 1914 tinha de fato trazido o "fim do mundo" no sentido de Deus ter 'legalmente' acabado com a concessão de poder das nações na terra. Também isto foi abandonado e sustentam agora que o "fim," ou "terminação do sistema de coisas" (como é traduzido na Tradução do Novo Mundo) está para acontecer.

Sendo invisíveis todas as coisas anunciadas, é óbvio que a sua aceitação depende inteiramente da fé de cada um nas interpretações oferecidas. Depois de uma sessão em que estas profecias envolvendo datas e estas mudanças vieram a discussão, Bill Jackson, membro do Corpo Governante disse-me, a sorrir, "Nós costumava-mos dizer, tire a data deste ombro e ponha-a no outro ombro."

Não foi senão depois da morte de Rutherford em 1942 que foi feita uma mudança relativa ao ano 606 A.E.C. como o ponto de partida para os 2.520 anos. Estranhamente, o fato de 2.520 anos contados a partir de 606 A.E.C. levarem a 1915 E.C., e não a 1914 E.C., não foi reconhecido ou considerado por mais de 60 anos.

Então, dissimuladamente, o ponto de partida foi atrasado um ano para 607 A.E.C., permitindo a retenção do ano 1914 E.C. como o ponto em que terminaram os 2.520 anos. Nenhuma evidência histórica tinha aparecido para indicar que a destruição de Jerusalém tinha ocorrido um ano mais cedo do que se acreditava. O desejo da organização de reter 1914 como uma data marcada para a qual eles tinham apontado por tantos anos (algo que não tinham feito em relação a 1915) ditou que se atrasasse a destruição de Jerusalém um ano, uma coisa simples de se fazer -- no papel.

Em meados da década de 1940 tinha sido decidido que a cronologia usada durante as presidências de Russell e Rutherford estava errada em uns 100 anos no que diz respeito à contagem do tempo até à criação de Adão. Em 1966, a organização disse que, em vez de vir em 1874 como fora previamente ensinado, o fim dos seis mil anos de história humana viria em 1975.

Isto foi publicado no verão de 1966 num livro escrito por Fred Franz, intitulado Vida Eterna na Liberdade dos Filhos de Deus. No seu primeiro capítulo, o livro referia-se ao arranjo do jubileu, que também tinha figurado proeminentemente nas predições relativas a 1925, e argumentava (tal como também tinha sido feito então) a favor da crença em seis "dias" de mil anos cada, durante os quais a humanidade experimentaria a imperfeição, aos quais se seguiria um sétimo "dia" de mil anos no qual a perfeição seria restaurada num grandioso Jubileu de libertação da escravidão ao pecado, doença e morte. O livro disse nas páginas 27-29:

41 Desde o tempo de Ussher, fizeram-se estudos intensivos da cronologia bíblica. Neste século vinte, realizou-se um estudo independente que não acompanha cegamente certos cálculos cronológicos tradicionais da cristandade, e a tabela de tempo publicada, resultante deste estudo independente, fornece a data da criação do homem como sendo 4026 A.E.C.* Segundo esta cronologia bíblica fidedigna, os seis mil anos desde a criação do homem terminarão em 1975 e o sétimo período de mil anos da história humana começará no outono (segundo o hemisfério setentrional) do ano 1975 E.C.

42 Assim, seis mil anos da existência do homem na terra acabarão em breve, sim, dentro desta geração. Jeová Deus não tem limite de tempo, conforme está escrito no Salmo 90:1, 2: "ó Jeová, tu mesmo mostraste ser uma verdadeira habitação para nós durante geração após geração. Antes de nascerem os próprios montes ou de teres passado a produzir como que com dores de parto a terra e o solo produtivo, sim, de tempo indefinido a tempo indefinido, tu és Deus." Portanto, do ponto de vista de Jeová Deus, a passagem destes seis mil anos da existência humana são apenas como que seis dias de vinte e quatro horas, pois este mesmo salmo (versículos 3 e 4) prossegue, dizendo: "Fazes o homem mortal voltar à matéria quebrantada e dizes: 'Retornai, filhos dos homens.' Pois mil anos aos teus olhos são apenas como o ontem que passou e como uma vigília durante a noite." Assim, dentro de poucos anos em nossa própria geração atingiremos o que Jeová Deus poderia considerar como o sétimo dia da existência do homem.

Qual seria o significado disto? O livro continua e faz esta aplicação dos pontos desenvolvidos:

Quão apropriado seria se Jeová Deus fizesse deste vindouro sétimo período de mil anos um período sabático de descanso e livramento, um grandioso sábado de jubileu para se proclamar liberdade através da terra a todos os seus habitantes! Isto seria muito oportuno para a humanidade. Seria bem apropriado da parte de Deus, pois, lembre-se de que a humanidade ainda tem na sua frente o que o último livro da Bíblia Sagrada chama de reinado de Jesus Cristo sobre a terra por mil anos, o reinado milenar de Cristo. Jesus Cristo, quando na terra há dezenove séculos, disse profeticamente a respeito de si mesmo: "Porque Senhor do sábado é o que é o Filho do homem." (Mateus 12:8) Não seria por mero acaso ou acidente, mas seria segundo o propósito amoroso de Jeová Deus que o reinado de Jesus Cristo, o "Senhor do sábado," correspondesse ao sétimo milênio da existência do homem.

Tinha a organização dito 'abertamente' que 1975 marcaria o princípio do milênio? Não. Mas o parágrafo acima era o clímax para o qual se encaminhava toda a argumentação cuidadosamente construída daquele capítulo.

Não foi feita uma predição absoluta, incondicional, acerca de 1975. Mas o escritor achou por bem declarar que era "apropriado" e "bem apropriado da parte de Deus" se Deus começasse o milênio naquele tempo específico. Pareceria razoável que para um homem imperfeito dizer o que é ou não é "acertado" para o Todo Poderoso Deus fazer, necessitaria de uma boa dose de certeza, seguramente que não a mera 'expressão de uma opinião.' A discrição requereria, mais ainda, ordenaria isso. Ainda mais forte é a declaração subsequente segundo a qual "seria segundo o propósito amoroso de Jeová Deus que o reino de Jesus Cristo, o 'Senhor do sábado,' correspondesse ao sétimo milênio da existência do homem," sétimo milênio esse que já tinha sido dito que começaria em 1975.

No mesmo ano, a edição de 8 de outubro de 1966 da Awake! [em português: Despertai! de 22 de abril de 1967], a revista associada à Watchtower, continha um artigo intitulado "Quanto Tempo Ainda Levará?" e a seguir ao subtítulo "Os 6.000 Anos Terminam em 1975," também se argumentava que o milênio constituiria os últimos 1.000 anos de um dia de descanso de Deus de 7.000 anos. O artigo continuava, dizendo (páginas 19 e 20):

Consequentemente, o fato de nos estarmos a aproximar do fim dos primeiros 6.000 anos da existência do homem é muito significativo.

Será que o dia de descanso de Deus eqüivale ao tempo em que o Homem tem estado na terra desde a sua criação? Aparentemente, sim. Das mais fiáveis investigações em cronologia Bíblica harmonizadas com muitas datas aceites da história secular, descobrimos que Adão foi criado no outono do ano 4026 A.E.C. Algures nesse mesmo ano Eva podia muito bem ter sido criada, começando o dia de descanso de Deus imediatamente a seguir. Em que ano terminariam, então, os primeiros 6.000 anos da existência do homem e também os primeiros 6.000 anos do dia de descanso de Deus? No ano 1975.* Isto é digno de nota, particularmente em vista do fato de os "últimos dias" terem começado em 1914, e de os fatos físicos dos nossos dias em cumprimento da profecia marcarem esta como sendo a última geração deste mundo iníquo. Por isso podemos esperar que o futuro imediato esteja cheio de acontecimentos emocionantes para aqueles que depositam a sua fé em Deus e nas suas promessas. Isto significa que dentro de relativamente poucos anos nós vamos testemunhar o cumprimento das restantes profecias que têm que ver com o "tempo do fim."

A Watchtower de 1.º de maio de 1968 [em português: A Sentinela de 1.º de novembro de 1968] continuou esta estimulação da antecipação. Usando muitos dos mesmos argumentos do último artigo mencionado disse (página 272 [em português: página 660]):

"O futuro imediato está certamente repleto de eventos culminantes, pois este velho sistema está perto do seu fim completo. Dentro de poucos anos no máximo as últimas partes da profecia Bíblica relativas a estes "últimos dias" vão-se cumprir resultando na libertação da humanidade sobrevivente para o glorioso reino de Cristo de 1.000 anos. Que dias difíceis, mas, ao mesmo tempo, grandiosos estão mesmo à frente!" [itálicos meus]

Hoje, mais de um quarto de século depois, podemos perguntar, O que quer dizer a frase "o futuro imediato"? Quantos anos são "poucos anos no máximo"?

Num artigo intitulado "O Que Trará a Década de 1970?" a Awake! de 8 de outubro de 1968 [em português: Despertai! de 22 de abril de 1969], enfatizou outra vez a brevidade do tempo que resta, dizendo no princípio (página 13):

"O fato de cinqüenta e quatro anos do período chamado 'os últimos dias' já terem passado é altamente significativo. Significa que restam apenas alguns anos, no máximo, antes que o corrupto sistema de coisas que domina a terra seja destruído por Deus."

Mais tarde, comentando sobre o ano de 1975 como o fim de seis mil anos de história humana, o artigo disse (página 14):

"Existe outra maneira que ajuda a confirmar o fato de estarmos a viver nos últimos anos deste 'tempo do fim.' (Dan. 12:9) A Bíblia mostra que nos estamos a aproximar do fim de 6.000 anos completos de história humana."

As publicações da Watch Tower Society citaram repetidamente declarações feitas por pessoas proeminentes ou "peritos" em qualquer área que fizeram algum referência a 1975, por exemplo, a declaração feita em 1960 pelo antigo Secretário de Estado dos Estados Unidos, Dean Acheson, que disse:

"Sei o bastante acerca do que se está a passar para lhe assegurar que, daqui a 15 anos [portanto, em 1975], este mundo será demasiado perigoso para se viver nele."

O livro Fome -- 1975!, escrito por dois peritos em alimentos, foi citado repetidamente, particularmente estas declarações:

"Em 1975 um desastre de magnitude sem precedentes vai atingir o mundo. Fomes, maiores do que quaisquer outras na história, devastarão as nações subdesenvolvidas."

"Prevejo uma data específica, 1975, quando a nova crise estará sobre nós em toda a sua importância terrível."

"Em 1975 desordem civil, anarquia, ditaduras militares, inflação descontrolada, colapso nos transportes e inquietação caótica serão a ordem do dia em muitas das nações famintas."

Três anos depois do enfoque original sobre 1975 no livro Vida Eterna na Liberdade dos Filhos de Deus, o autor, Fred Franz, escreveu outra publicação intitulada A Paz de Mil Anos que se Aproxima.1 A linguagem deste livro era ainda mais definitiva e específica do que na publicação anterior. Lançado em 1969, continha estas afirmações nas páginas 25 e 26:

Mais recentemente pesquisadores sérios da Bíblia Sagrada fizeram um ajuste na sua cronologia. Segundo os seus cálculos, os seis milênios da vida da humanidade na terra terminariam em meados dos anos setenta. Consequentemente o sétimo milênio desde a criação do homem por Jeová Deus começaria dentro de menos de dez anos.

———————

Para que o Senhor Jesus Cristo seja "Senhor até do sábado," o seu reino de mil anos teria de ser o sétimo numa série de períodos de mil anos, ou milênios. (Mateus 12:8, AV) Assim seria um reino sabático.

A argumentação aqui é muito clara e direta: Como o sábado era o sétimo período a seguir a seis períodos de trabalho, assim também o reino de Cristo de mil anos será um sétimo milênio sabático a seguir àqueles seis milênios de trabalho e sofrimento. A apresentação não é de modo nenhum indefinida ou ambígua. Como diz a página 26:

"Para que o Senhor Jesus Cristo seja 'Senhor até do sábado,' o seu reino de mil anos teria de ser o sétimo numa série de períodos de mil anos, ou milênios."

Tal como tinha sido determinado o que seria "apropriado" e "acertado" para Deus fazer, também agora é estabelecido um requisito para Jesus Cristo. Para ele ser o que diz que será, 'Senhor do sábado,' então o reino dele "teria de ser" o sétimo milênio numa série de milênios. O raciocínio humano impõe este requisito sobre o Filho de Deus. Seis mil anos terminariam em 1975; o domínio de Cristo, segundo o argumento, "teria de ser o sétimo" milhar de anos que se seguia. O "escravo fiel e discreto" tinha, com efeito, esboçado o programa a que ele esperava que o seu Mestre aderisse se este se quisesse mostrar verdadeiro para com a sua própria palavra.

Embora a escrita seja mais polida, as expressões mais refinadas, esta matéria é na essência muito semelhante àquela apresentada no folheto do Juiz Rutherford Milhões Que Agora Vivem Jamais Morrerão, no qual fez declarações que depois admitiu serem de burro. Tirando a data que estava a ser publicitada, era como se o relógio tivesse agora sido recuado cerca de meio século para os dias anteriores a 1925. A diferença era que as coisas ditas então estavam agora a ser ditas a respeito de 1975.2

Quando os anos setenta chegaram, continuaram a ser criadas expectativas. A Awake! de 8 de outubro de 1971 [em português: Despertai! de 22 de abril de 1972] falou ainda mais uma vez de seis períodos de sofrimento e trabalho seguidos por um sétimo período (sabático) de descanso e disse [página 28]:

"Assim, ao nos aproximarmos do término de seis mil anos de existência humana, durante esta década, há emocionante esperança de que um grandioso Sábado de descanso e alívio se acha deveras às portas."

Por baixo disto estava o seguinte gráfico [página 27]:

Todas estas afirmações destinam-se claramente a fomentar e criar esperança, antecipação. Não se destinam a acalmar ou dissipar um espírito de expectativa excitada. É verdade que a maioria delas foram acompanhas por algumas declarações do tipo 'nós não estamos a dizer peremptoriamente,' ou, não estamos a 'apontar para uma data específica', e que 'nós não sabemos o dia e a hora.' Mas é preciso não esquecer que a organização não era um principiante neste campo. Desde o início, toda a sua história consistiu em suscitar a esperança das pessoas em certas datas e depois ver essas datas passarem sem que a esperança se tenha realizado. Em casos anteriores as publicações da Sociedade procuraram subseqüentemente lançar a responsabilidade por qualquer desilusão sobre os destinatários da informação e não sobre os emissores, como inclinados a esperar demais. Portanto, certamente os homens com responsabilidades na organização devem ter-se apercebido do perigo, do que é a natureza humana, e quão facilmente se podem excitar grandes esperanças.

Ainda assim, ao mesmo tempo que evitavam cuidadosamente qualquer predição explícita indicando que uma data específica veria o princípio do milênio, aqueles homens com responsabilidades aprovaram o uso das frases, "dentro de relativamente poucos anos", "o futuro imediato", "dentro de alguns anos no máximo", "apenas poucos anos, no máximo" "os poucos anos finais" todas usadas nas revistas Watchtower e Awake! com referência ao começo do reinado milenar e todas num contexto que incluía a data de 1975. Será que tais palavras não significam nada? Ou foram usadas de maneira vaga, negligente? Será que se deve brincar com as esperanças, os planos e os sentimentos das pessoas? E no entanto a Watchtower de 15 de agosto de 1968 [em português: A Sentinela de 15 de fevereiro de 1969, p. 116] até deixou implícito que se devia ter cuidado para não colocar muita ênfase nas próprias palavras de aviso de Jesus Cristo.

35 Uma coisa é absolutamente certa, a cronologia bíblica reforçada pelo cumprimento das profecias bíblicas mostra que seis mil anos de existência do homem vão acabar em breve, sim, nesta geração! (Mat. 24:34) Este não é, portanto, o tempo para ser indiferente e complacente. Este não é o tempo para se estar a brincar com as palavras de Jesus de que "com respeito àquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos dos céus nem o Filho, mas unicamente o Pai." (Mat. 24:36) Pelo contrário é um tempo em que se deve estar plenamente ciente de que o fim deste sistema de coisas está a chegar rapidamente ao seu fim violento. Não se engane, é suficiente que o próprio Pai saiba o "dia e a hora"!

Como é que um "escravo fiel e discreto" poderia alguma vez dizer isto -- de fato, dizer que, "é verdade, o meu mestre disse isto e isto, mas não liguem muito; pelo contrário, percebam que o que eu vos estou a dizer devia ser a força orientadora na vossa vida"?

Algumas das declarações mais diretas vieram do Departamento de Serviço dos escritórios internacionais (sede), que elabora um boletim mensal intitulado "Ministério do Reino," que só é distribuído às Testemunhas e não ao público. O número de março de 1968 [em português: maio de 1968, p. 4] instava que se fosse para a atividade de pregação a tempo inteiro ("serviço de pioneiro") dizendo:

Em vista do curto período de tempo que resta, desejamos fazer isso tão amiúde quanto as circunstâncias o permitam. Apenas pensem, irmãos, restam menos de noventa meses até que se completem os 6.000 anos da existência do homem na terra.

O número de maio de 1974 (em português: julho de 1974, pp. 3, 4) do Ministério do Reino, tendo-se referido ao "pouco tempo que restava", disse:

Receberam-se notícias a respeito de irmãos que venderam sua casa e propriedade e que planejam passar o resto dos seus dias neste velho sistema de coisas empenhados no serviço de pioneiro. Este é certamente, um modo excelente de passar o pouco tempo que resta antes de findar o mundo iníquo. -- 1 João 2:17.

Um bom número de Testemunhas fez precisamente isso. Alguns venderam os seus negócios, desistiram de empregos, venderam casas, quintas e mudaram-se com as suas esposas e crianças para outras áreas para 'servir onde a necessidade era maior,' esperando ter fundos suficientes para se manterem ao longo de 1975.

Outros, incluindo algumas pessoas mais velhas, levantaram o dinheiro de apólices de seguro ou de outros certificados de valor. Alguns adiaram operações cirúrgicas na esperança de que a entrada do milênio eliminasse a necessidade destas.

Quando 1975 passou e os seus fundos acabaram ou a sua saúde piorou seriamente, eles tiveram de enfrentar as duras realidades e reconstruir as coisas o melhor que puderam.

Qual era o pensamento dentro do Corpo Governante durante este tempo?

Alguns dos homens mais velhos do Corpo tinham experimentado pessoalmente as expectativas falhadas de 1914, 1925, bem como as esperanças excitadas no princípio dos anos quarenta. A maioria, segundo observei, tomou uma atitude do tipo 'esperar para ver.' Eles estavam relutantes em pedir contenção. Estavam a ocorrer grandes aumentos. Considere o registo de batismos para o período de 1960 a 1975:

Ano Número de Batizados Ano Número de Batizados
1960 69.027 1968   82.842
1961 63.070 1969 120.805
1962 69.649 1970 164.193
1963 62.798 1971 149.808
1964 68.236 1972 163.123
1965 64.393 1973 193.990
1966 58.904 1974 297.872
1967 74.981 1975 295.073

Desde 1960 até 1966, a percentagem de aumento tinha diminuído até praticamente parar. Mas depois de 1966, quando 1975 foi focado, veio um período de aumento fenomenal, como o quadro revela.

Durante os anos de 1971 a 1974 enquanto estive a servir no Corpo Governante, não me lembro de ouvir nenhumas expressões fortes de preocupação de membros do Corpo acerca das expectativas excitadas que tinham sido geradas. Não pretendo fingir que inicialmente não me senti eu próprio agitado em 1966 quando o livro Vida Eterna na Liberdade dos Filhos de Deus saiu com a sua imagem resplandecente da proximidade de um jubileu milenar. Nem negaria ter participado na primeira parte da campanha para focar atenção na data alvo de 1975. Mas cada ano que passava de 1966 em diante tornava a idéia cada vez mais irreal. Quanto mais eu lia as Escrituras, mais todo o conceito parecia desalinhado; não se enquadrava nas declarações do próprio Jesus Cristo, declarações tais como:

"Com respeito àquele dia e àquela hora ninguém sabe, nem os anjos do céu nem o Filho, mas unicamente o Pai."

"Portanto, mantende-vos vigilantes, pois não sabeis em que dia vem o vosso Senhor."

"Assim também vós mostrai-vos prontos, porque o Filho do Homem vem numa hora em que não o esperais."

"Mantendo-vos vigilantes, mantende-vos despertos, pois não sabeis quando é o tempo designado."

"Não vos pertence ter conhecimento dos tempos e épocas que o Pai colocou sob a sua própria jurisdição."3

Contudo, como membro da sede de uma organização que estava excitada de alegria por experimentar uma onda de aumento notável, não havia muito que pudesse fazer. Tentei moderar alguns artigos sobre o assunto, que me foram submetidos para editar, mas foi praticamente tudo o que fiz. Na minha atividade pessoal tentei focar a atenção nos textos mencionados acima, tanto em conversas privadas como em discursos públicos.

Um Domingo à noite em 1974, depois de a minha esposa e eu termos voltado de um discurso em outra parte do país, o meu tio, então vice-presidente, veio para o nosso quarto. (Sendo a sua vista extremamente fraca, nós costumávamos ler-lhe em voz alta a matéria de estudo da Watchtower todas as semanas.) A minha esposa disse-lhe que no meu discurso naquele fim de semana eu tinha acautelado os irmãos contra tornar-se indevidamente excitado acerca de 1975. A sua resposta rápida foi, "E por que é que eles não deviam ficar excitados? É uma coisa sobre a qual se deve ficar excitado."

Não tenho dúvidas nenhumas que, de todos os membros do Corpo Governante, o vice presidente era o que estava mais convicto da justeza do que tinha escrito, e sobre cuja escrita outros tinham trabalhado. Noutra noite no verão de 1975, um irmão grego idoso chamado Peterson (originalmente chamava-se Papagyropoulos) juntou-se à nossa leitura, como era seu costume. Depois da leitura, o meu tio disse a Peterson, "Sabe, era muito semelhante a isto em 1914. Precisamente até aos meses de verão estava tudo calmo. Depois, as coisas começaram a acontecer subitamente e a guerra rebentou."

Antes disto, no princípio de 1975, o Presidente Knorr fez uma viagem à volta de mundo, levando o Vice Presidente Franz consigo. Em todos os países visitados, os discursos do vice presidente centraram-se em 1975. Depois do regresso deles, os outros membros do Corpo Governante, tendo ouvido relatos de muitos países acerca do efeito excitante do discurso do vice presidente, pediram para ouvir uma gravação, feita na Austrália.4

No seu discurso, o vice presidente falou de 1975 como sendo um "ano de grandes possibilidades, tremendas probabilidades." Ele disse à audiência que, segundo o calendário hebraico, estavam "já no quinto mês lunar de 1975," com menos de sete meses lunares até ao fim do ano. Ele enfatizou várias vezes que o ano hebraico iria acabar no Rosh Hashanah, o Novo Ano judaico, em 5 de setembro de 1975.

Reconhecendo que muitas coisas teriam de acontecer num curto espaço de tempo se o fim viesse naquela altura, ele depois falou sobre a possibilidade de um ano ou perto disso de diferença devido a um lapso de tempo entre a criação de Adão e a criação de Eva. Ele fez referência às expectativas falhadas em 1914 e 1925 e citou o comentário de Rutherford, "Fiz figura de parvo." Ele disse que a organização tinha aprendido a não fazer "predições muito arrojadas, nem muito extremas." Perto do fim, contudo, ele instou os ouvintes a não adotarem um ponto de vista impróprio, e pensarem que a destruição que aí vinha poderia estar "anos à frente," e focarem a sua atenção em outros assuntos, como casar e constituir famílias, estabelecer um bom negócio ou gastar anos na universidade em algum curso de engenharia.

Depois de ouvir a gravação, alguns dos membros do Corpo Governante expressaram preocupação dizendo que se não estavam a ser feitas nenhumas "predições muito arrojadas, nem muito extremas," pelo menos algumas predições subtis estavam, e que o efeito era evidente na excitação criada.

Esta foi a primeira vez que foi expressa preocupação nas discussões do Corpo Governante. Mas não foi tomada qualquer ação, nem foi decidida qualquer política. O vice presidente repetiu muitos dos pontos do mesmo discurso em 2 de março de 1975, na cerimônia de graduação da Escola de Gileade seguinte.5

1975 passou -- tal como tinham passado 1881, 1914, 1918, 1920, 1925 e a década de 1940. Foi dada muita publicidade por outros ao falhanço das expectativas da organização acerca de 1975. Houve considerável conversa entre as próprias Testemunhas. Na minha opinião, a maior parte do que foi dito não tocou no ponto principal da questão.

Senti que a verdadeira questão ia muito além da exatidão ou inexatidão de algum indivíduo ou até em saber se se pode ou não confiar numa organização ou na sensibilidade e credulidade dos seus membros. Pareceu-me que o fator verdadeiramente importante era como é que tais predições se refletem no fim sobre Deus e sobre a sua Palavra. Quando homens fazem tais vaticínios e dizem que o fazem baseados na Bíblia, constróem argumentos para esse vaticínios a partir da Bíblia, asseveram que eles são o "canal" de comunicação de Deus -- qual é o efeito quando as suas predições falham? Será que isto honra a Deus ou contribui para edificar a fé Nele e confiança na sua palavra? Ou tem o resultado contrário? Não dá motivos adicionais para que alguns se sintam justificados a atribuir pouca importância à mensagem e aos ensinos da Bíblia? Aquelas Testemunhas que fizeram grandes mudanças nas suas vidas em muitos casos podiam ,e foi o que fizeram, remediar a situação e continuar a viver apesar de estarem desiludidas. Mas nem todos o puderam fazer. Contudo, seja qual for o caso, tinham sido provocados sérios danos de várias maneiras.

Em 1976, um ano depois de ter passado aquela data tão amplamente publicitada, alguns membros do Corpo Governante começaram a insistir em que devia ser feita uma declaração reconhecendo que a organização tinha errado, tinha estimulado falsas expectativas. Outros disseram que não concordavam, que isso "só daria munições aos opositores." Milton Henschel recomendou que a coisa sábia a fazer seria simplesmente não mencionar o assunto e que com o tempo os irmãos parariam de falar sobre isso. Claramente, não havia apoio suficiente para uma moção a favor de se fazer uma declaração. Naquele ano, um artigo na Watchtower de 15 de julho [em português: A Sentinela de 15 de janeiro de 1977] referiu-se de fato às expectativas frustradas mas teve de se conformar ao sentimento prevalecente no seio do Corpo Governante, e não foi possível fazer um reconhecimento claro da responsabilidade da organização.

Em 1977, o assunto surgiu outra vez numa sessão. Embora tenham sido levantadas as mesmas objeções, foi aprovada uma moção que defendia a inclusão de uma declaração num discurso de um congresso, que Lloyd Barry tinha a responsabilidade de preparar. Percebi que depois os membros do Corpo Governante Ted Jaracz e Milton Henschel falaram com Lloyd acerca do que pensavam do assunto. Seja como for, quando o discurso foi preparado, não foi incluída qualquer referência a 1975. Lembro-me de ter interrogado Lloyd a este respeito e a resposta dele foi que não tinha conseguido encaixar a referência a 1975 no assunto do discurso. Passaram-se quase dois anos e então, em 1979, o Corpo Governante considerou novamente o assunto. Naquela altura tudo indicava que 1975 tinha provocado uma grave "falha na credibilidade."

Vários membros do pessoal da sede expressaram-se nesse sentido. Um deles descreveu 1975 como um "albatroz" pairando sobre as nossas cabeças. Robert Wallen, um secretário do Corpo Governante, escreveu o seguinte:

"Eu tenho estado associado como uma Testemunha de Jeová batizada há mais de 39 anos e com a ajuda de Jeová continuarei a ser um servo leal. Mas mentiria se dissesse que não estou desapontado, pois, quando vejo que os meus sentimentos a respeito de 1975 foram acalentados pelo que li em várias publicações, e quando me dizem que na realidade cheguei a conclusões erradas por mim próprio, isso, parece-me, não é justo nem honesto. Sabendo que não estamos a trabalhar com infalibilidade, parece-me apropriado que quando são cometidos erros por homens imperfeitos, mas tementes a Deus, sejam feitas correções quando os erros são descobertos."

Raymond Richardson do Departamento de Redação disse:

"Não estão as pessoas mais inclinadas a ser humildes, e mais dispostas a depositar confiança, onde existe honestidade? A própria Bíblia é o maior exemplo de honestidade. Esta é uma das razões mais salientes porque acreditamos que ela é verdadeira."

Fred Rusk do Departamento de Redação, escreveu:

"Apesar de quaisquer declarações oficiais que possam ter sido feitas entretanto, admoestando os irmãos a não dizerem que o Armagedom viria em 1975, a verdade é que houve vários artigos nas revistas e noutras publicações que foram além de meramente sugerir que o Velho sistema seria substituído pelo novo sistema de Jeová em meados dos anos setenta."

Merton Campbell do Departamento de Serviço escreveu:

"No outro dia uma irmã telefonou de Massachusetts. Ela estava a trabalhar. Tanto a irmã como o marido estão a trabalhar para pagar contas que se acumularam por causa de doenças. Ela expressou ter-se sentido tão confiante que 1975 traria o fim que ambos estavam a ter problemas em suportar os fardos deste sistema. Este exemplo é típico de muitos irmãos que encontramos."

Harold Jackson, também do Departamento de Serviço, disse:

"O que é preciso agora não é uma declaração dizendo que estávamos enganados acerca de 1975 mas antes uma declaração explicando por que é que todo o assunto tem sido ignorado há tanto tempo em vista do fato de tantas vidas terem sido afetadas. Agora é com uma falha na credibilidade que nos deparamos e que pode ser desastrosa. Se vamos dizer alguma coisa, falemos francamente e sejamos abertos e honestos com os irmãos."

Howard Zenke, do mesmo Departamento, escreveu:

"Certamente não queremos que os irmãos leiam ou ouçam alguma coisa e depois digam para si mesmos que a atitude que tomamos eqüivale a um 'Watergate.'"

Outros fizeram comentários semelhantes. Ironicamente, alguns dos que agora se expressavam com críticas mais fortes tinham estado eles próprios entre os que mais se faziam ouvir antes de 1975, acentuando aquela data e a extrema "urgência" que ela requeria, tinham até escrito alguns dos artigos citados anteriormente, tinham aprovado a declaração do Ministério do Reino que elogiava aqueles que estavam a vender casas e propriedade à medida que 1975 se aproximava. Muitas das declarações mais dogmáticas acerca de 1975 foram feitas por representantes viajantes (Superintendentes de Circuito e de Distrito) que estavam todos sob a supervisão direta do Departamento de Serviço.

Na sessão do Corpo Governante de 6 de março de 1979, foram apresentados os mesmos argumentos contra publicar qualquer declaração -- que isso iria expor a organização a maior criticismo da parte dos opositores, que nesta data tão tardia já não havia necessidade de pedir desculpas, que na verdade não se conseguiria nada com isso. Contudo, mesmo aqueles que argumentavam assim estavam menos inflexíveis do que em sessões anteriores. A razão era um fator em particular: os números da atividade mundial tinham registado sérias quebras já por dois anos.

Os relatórios anuais do número total de participantes na atividade de testemunho revelam isto:

Ano N.º Total Relatando
Actividade
% Aumento Sobre
Ano Anterior
1970 1.384.782 10,2
1971 1.510.245   9,1
1972 1.596.442   5,7
1973 1.656.673   3,8
1974 1.880.713 13,5
1975 2.062.449   9,7
1976 2.138.537   3,7
1977 2.117.194 -1,0
1978 2.086.698 -1,4

Esta quebra, mais do que qualquer outro factor, pareceu importante para os membros do Corpo Governante. Houve uma votação de 15 contra 3 a favor de uma declaração que reconhecesse a quota parte de responsabilidade da organização pelo erro. Essa declaração foi publicada na Watchtower de 15 de março de 1980 [em português: A Sentinela 15 de setembro de 1980].

Tinha demorado quase quatro anos até que a organização finalmente admitisse, através da sua administração, que tinha estado errada, que tinha, durante uma década inteira, construído falsas esperanças. Não que uma declaração tão cândida, embora verdadeira, pudesse ser feita. O que fosse escrito tinha de ser aceitável para o Corpo como um todo para publicação. Eu sei, porque fui designado para escrever a declaração e, tal como em casos similares antes, eu tinha de ser guiado -- não por aquilo que gostaria de dizer ou até pelo que pensava que os irmãos precisavam de ouvir -- mas pelo que poderia ser dito e receber a aprovação por dois terços quando fosse submetido ao Corpo Governante.

Hoje, o fato de terem sido criadas esperanças centradas em 1975 ao longo de toda uma década é minimizado como não tendo nenhuma importância particular. A essência das palavras de Russell em 1916 é novamente expressa pela organização: Aquilo "teve certamente um efeito muito estimulante e santificador sobre milhares de pessoas, e todas elas podem agradecer ao Senhor -- até pelo engano."

1914 e "Esta Geração"

"Pois o leito mostrou-se curto demais para se estirar nele, e o próprio lençol tecido é [demasiado] estreito para se enrolar nele." -- Isaías 28:20.

O Corpo Governante das Testemunhas de Jeová sente uma considerável incomodidade quanto ao que continua a ser a maior profecia da organização relacionada com datas. O período de tempo reservado para o seu cumprimento está-se a mostrar muito curto e apertado para conter as coisas preditas. A passagem de cada ano só acentua esta incomodidade.

1914, durante mais de três décadas o ponto final das profecias da organização relacionadas com datas, é agora o ponto inicial para a profecia que constitui o estímulo principal para a "urgência" na atividade das Testemunhas de Jeová. É afirmado que as palavras de Jesus Cristo, "Deveras eu vos digo que esta geração não passará de maneira nenhuma sem que todas estas coisas ocorram," começaram a ter aplicação naquele ano, 1914. Repare nas afirmações que estão em negrito.

Jesus estava obviamente a falar daqueles que tinham idade suficiente para presenciar com compreensão o que aconteceu quando os "últimos dias" começaram. Jesus estava a dizer que algumas daquelas pessoas que estavam vivas quando surgiu o 'sinal dos últimos dias' ainda estariam vivas quando Deus trouxesse o fim deste sistema.

Mesmo se admitirmos que jovens de 15 anos de idade teriam o discernimento suficiente para se aperceberem da importância do que aconteceu em 1914, ainda assim os mais novos desta "geração" teriam perto de 70 anos de idade hoje. Portanto a grande maioria da geração a que Jesus se referiu já desapareceu na morte. Os que restam estão-se a aproximar de uma idade avançada. E lembre-se que Jesus disse que o fim deste mundo iníquo viria antes de essa geração desaparecer na morte. Isto, por si só, diz-nos que os anos que faltam antes de vir o fim predito não podem ser muitos.

Quando a revista Awake! de 8 de outubro de 1968 (páginas 13, 14 [em português: Despertai! de 22 de abril de 1969]) discutiu isto há mais de um quarto de século nos tempos anteriores a 1975, a ênfase era colocada sobre quão proximamente a geração de 1914 iria desaparecer, quão pouco tempo faltava para o fim do período de vida dessa geração. Se uma Testemunha de Jeová qualquer sugerisse nesse tempo que as coisas poderiam continuar por mais vinte ou trinta anos seria vista como manifestando uma má atitude, que não evidenciava uma fé forte.

Quando 1975 passou, a ênfase mudou. Agora faziam-se esforços para mostrar que o período de duração da geração de 1914 não era tão pequeno como se poderia pensar, que ainda se poderia prolongar por mais alguns anos.

Assim, a Watchtower de 1.º de outubro de 1978 [em português: A Sentinela de 15 de janeiro de 1979] mencionou, não aqueles presenciando "com compreensão aquilo que aconteceu" em 1914, mas os que "poderiam observar" os acontecimentos que começaram naquele ano. A mera observação é muito diferente da compreensão. Isto poderia logicamente baixar o limite de idade daqueles que formam "esta geração".

Dando continuidade a esta tendência, dois anos depois, a Watchtower de 15 de outubro de 1980 [em português: A Sentinela de 15 de abril de 1981, p. 31], citou um artigo da revista U.S. News & World Report que sugeria a possibilidade de dez anos de idade serem o ponto em que os acontecimentos começam a criar "uma impressão duradoura na memória de uma pessoa." O artigo disse que, se isso fosse verdade, "então existem hoje mais de 13 milhões de americanos que se recordam da I Guerra Mundial."

'Recordar-se' também permite considerar uma idade mais baixa do que a compreensão (que se sugeriu existir em "jovens de 15 anos de idade" na Awake! de 1968 citada anteriormente). De fato, a I Guerra Mundial continuou até 1918, tendo o envolvimento americano começado apenas em 1917. Portanto a idade de 10 anos apresentada na revista noticiosa não se aplica necessariamente a 1914.

Embora diferentes maneiras de medir o tempo possam ganhar um ano, ou perto disso, aqui e ali, o fato é que o período da geração de 1914 está a diminuir com grande rapidez, visto que a taxa de mortalidade é sempre maior entre aqueles mais idosos. O Corpo Governante está ao corrente disto, pois o assunto veio a discussão várias vezes.

O assunto veio a lume durante a sessão do Corpo Governante em 7 de junho de 1978. Fatores anteriores levaram a isto. Albert Schroeder, membro do Corpo Governante, tinha distribuído aos outros membros uma cópia de um relatório demográfico sobre os Estados Unidos. A informação indicava que menos de um porcento da população que já tinha passado a adolescência em 1914 ainda estava viva em 1978. Mas um fator que chamava mais atenção tinha que ver com declarações que Schroeder tinha feito quando visitou certos países na Europa.

Chegavam relatórios a Brooklyn dizendo que ele tinha sugerido a outros que a expressão "esta geração" usada por Jesus em Mateus capítulo vinte e quatro, versículo 34, aplicava-se à geração dos "ungidos", e que enquanto algum destes ainda vivesse a "geração" não teria passado. Isto era, claro está, contrário ao ensino da organização e não estava autorizado pelo Corpo Governante.

Quando o assunto foi abordado, depois do regresso de Schroeder, a interpretação que ele tinha sugerido foi rejeitada e foi votado que fosse incluída uma "Pergunta dos Leitores" num número futuro da Watchtower reafirmando o ensino tradicional a respeito de "esta geração."6 Curiosamente, não foi dirigida nenhuma repreensão ou censura ao membro do Corpo Governante Schroeder por ter divulgado o seu ponto de vista não autorizado, contrário à posição oficial, enquanto na Europa.

O assunto surgiu outra vez tanto na sessão de 6 de março como na de 14 de novembro de 1979. Como estava a ser focada atenção no assunto, fiz cópias Xerox das primeiras vinte páginas do material recebido do ancião sueco que explicava em pormenor a história da especulação cronológica e revelava a verdadeira fonte do cálculo dos 2.520 anos e da data 1914. Cada membro do Corpo recebeu uma cópia. Além de um comentário casual, eles não acharam apropriado discutir a matéria.

Lyman Swingle, como coordenador do Departamento de Redação, já estava familiarizado com este material. Ele chamou a atenção do Corpo para algumas das afirmações dogmáticas e insistentes publicadas nas Watch Towers de 1922, lendo partes destas em voz alta para todos os membros. Ele disse que era muito novo em 1914 (só tinha então cerca de quatro anos de idade) para se lembrar de alguma coisa, mas que se lembrava das discussões que tinha havido na casa dele a respeito de 1925.7 Disse que também sabia o que tinha acontecido em 1975, e que pessoalmente não se queria enganar a respeito de mais uma data.

No decorrer da sessão, eu disse que a data inicial [para os 2.520 anos dos tempos dos Gentios] da Sociedade, 607 A.E.C., não tinha qualquer tipo de apoio na evidência histórica. Quanto a 1914 e à geração desse tempo, a minha pergunta foi: Se o ensino tradicional da organização é válido, como é que podemos aplicar as palavras acompanhantes de Jesus às pessoas que viviam em 1914? Ele disse: "Quando virdes todas estas coisas, sabei que ele está próximo às portas," e "quando estas coisas principiarem a ocorrer, erguei-vos e levantai as vossas cabeças, porque o vosso livramento está-se aproximando." As publicações afirmavam regularmente que aquelas palavras se começavam a aplicar de 1914 em diante, aos cristãos que viviam em 1914. Mas se assim era, então a quem dentre eles é que isto se poderia aplicar? àqueles que tinham na altura 50 anos de idade? Mas esses, se ainda fossem vivos, teriam, agora (isto é, em 1979, na data da discussão) 115 anos de idade. Aplicava-se aos que tinham 40 anos de idade? Esses teriam agora 105. Mesmo os que estavam na casa dos 30 teriam 95 e aqueles acabados de sair da adolescência teriam já 85 anos em 1979. (Mesmo estes teriam mais de 100 se ainda fossem vivos hoje.)

Portanto, se aquelas palavras motivadoras 'levantai as vossas cabeças porque o vosso livramento está-se aproximando, está próximo às portas,' se aplicavam de fato às pessoas em 1914 e significavam que elas podiam ter esperança de ver o fim, então seria razoável pensar que esse anúncio devia ser qualificado com as palavras: "Sim, vós podereis vê-lo -- isto é, desde que sejais agora muito jovens e vivais uma vida muito, muito longa." Como um exemplo, mencionei o meu pai que, nascido em 1891, era apenas um jovem de vinte e três anos em 1914. Ele viveu, não apenas setenta, ou oitenta anos, mas chegou aos oitenta e seis anos de idade. Ele estava já morto há dois anos e tinha falecido sem ver as coisas que tinham sido preditas.

Portanto perguntei ao Corpo quão significativa poderia ter sido em 1914 a aplicação das palavras de Jesus em Mateus capítulo vinte e quatro, versículos 33 e 34, se os únicos que podiam vê-las cumpridas eram crianças apenas na adolescência ou ainda mais novas? Não foi dada nenhuma resposta específica.

Vários membros, contudo, expressaram o seu apoio ao ensino da organização acerca de "esta geração" e da data 1914. Lloyd Barry expressou consternação pessoal por existirem dúvidas dentro do Corpo a respeito do ensino. Referindo-se às afirmações das Watch Towers de 1922 que Lyman Swingle tinha lido, ele disse que não via nada de preocupante nelas, que eram "verdade atual" para os irmãos daquele tempo.8 Quanto ao fato de a geração de 1914 estar acabada, ele indicou que na União Soviética existem regiões onde as pessoas vivem 130 anos. Ele insistiu que fosse expressa aos irmãos uma posição unida de forma que eles mantivessem o senso de urgência. Outros expressaram opiniões similares.

Quando o Presidente me voltou a conceder a palavra, o meu comentário foi que parecia que precisávamos de ter em mente que aquilo hoje ensinado como sendo "verdade presente" poderia tornar-se com o tempo "verdade passada," e que a "verdade presente" que substituiria essa "verdade passada" poderia ela própria ser substituída por "verdade futura." Eu sentia que a palavra "verdade" usada dessa maneira se tornava simplesmente sem significado.

Dois membros do Corpo disseram que se a explicação corrente não era a correta, então qual era a explicação das palavras de Jesus? Como a questão me parecia dirigida, respondi que pensava que havia uma explicação que se harmonizava com as Escrituras e com os fatos, mas qualquer coisa que fosse apresentada com certeza não devia ser uma "inspiração do momento," mas antes algo cuidadosamente pesquisado e ponderado. Eu disse que pensava existirem irmãos capazes de fazer esse trabalho mas eles precisariam da autorização do Corpo Governante. Estava o Corpo Governante interessado em que isto fosse feito? Não houve resposta e a questão foi abandonada.

No fim da discussão, com excepção de uns poucos, os membros do Corpo disseram que na sua opinião 1914 e o ensino sobre "esta geração" ligado a essa data deviam continuar a ser defendidos. O Coordenador do Comitê de Redação, Lyman Swingle, comentou, "Está bem, se é isso que querem fazer. Mas pelo menos vocês sabem que no que diz respeito a 1914, as Testemunhas de Jeová obtiveram a coisa toda -- tudo, tudo, completamente -- do Segundo Adventismo."

Talvez uma das coisas que mais me perturbou foi saber que, enquanto a organização insistia com os irmãos para manterem confiança inabalável na interpretação, havia homens em posições de responsabilidade dentro da organização que tinham eles próprios manifestado não ter confiança total nas predições baseadas na data de 1914.

Como exemplo notável disto, na sessão de 19 de fevereiro de 1975, depois de o Corpo Governante ter ouvido o discurso gravado de Fred Franz acerca de 1975, discutiu-se a incerteza das profecias envolvendo datas. Nathan Knorr, o presidente naquela altura, disse:

"Há algumas coisas que eu sei -- sei que Jeová é Deus, que Cristo Jesus é o seu Filho, que ele deu a sua vida como resgate por nós, que existe uma ressurreição. Sobre outras coisas eu não tenho tanta certeza. 1914 -- não sei. Temos falado acerca de 1914 já há muito tempo. Podemos estar certos e espero que estejamos."9

Naquela sessão a data em discussão era 1975, portanto foi uma surpresa que 1914, data muito mais fundamental, fosse referida nesse contexto. Conforme foi dito, as palavras do presidente foram proferidas, não numa conversa privada, mas perante o Corpo Governante em sessão.

Antes da discussão maior acerca de 1914 (na sessão completa do Corpo Governante, em 14 de novembro de 1979), o Comitê de Redação do Corpo tinha discutido numa reunião se era ou não aconselhável continuar a insistir em 1914.10 Na discussão do comitê foi sugerido que nós podíamos pelo menos evitar mencionar a data. Recordo-me de Karl Klein nos ter lembrado da prática algumas vezes seguida de simplesmente não mencionar um certo ensino durante algum tempo, de forma que se fosse feita alguma mudança, não causasse uma impressão tão forte.

Significativamente, o Comitê de Redação votou unanimemente que se seguisse basicamente essa mesma política nas publicações a respeito de 1914. Esta posição, contudo, foi sol de pouca dura, já que na sessão completa do Corpo Governante de 14 de novembro de 1979 ficou claro que a maioria era a favor de enfatizar a data como de costume.

Que as interrogações sobre este ensino não se limitavam a Brooklyn foi-me provado por um incidente que ocorreu enquanto eu fazia uma viagem à África Ocidental no outono de 1979. Na Nigéria, dois membros da Comissão da Filial Nigeriana e missionários de longa data, levaram-me a visitar uma propriedade que a Sociedade tinha comprado a fim de construir uma nova sede para a Filial. Na viagem de regresso perguntei quando esperavam ser possível a mudança para o novo local. A resposta foi que, com a limpeza do terreno, obter a aprovação dos planos e das licenças necessárias, e depois a construção propriamente dita, era improvável que a mudança fosse feita antes de 1983.

Por causa disto, perguntei, "Vocês recebem algumas perguntas dos irmãos locais quanto ao período de tempo que passou desde 1914?" Houve um silêncio momentâneo, e depois o Coordenador da Filial disse, "Não, os irmãos Nigerianos raramente fazer perguntas desse tipo -- mas NÓS sim." Quase imediatamente o missionário de longa data disse, "Irmão Franz, seria possível que a referência de Jesus a 'esta geração' se aplicasse apenas a pessoas daquele tempo que viviam a destruição de Jerusalém? Se fosse esse o caso, então tudo bateria certo."

Era evidente que da maneira que o ensino existente explicava as coisas, nem tudo parecia bater certo para ele. A minha resposta foi simplesmente que supunha ser essa uma possibilidade mas que não havia muito mais que pudesse ser dito a respeito dessa idéia. Repeti esta conversa ao Corpo Governante depois do meu regresso, pois deu-me um exemplo das questões que existiam na mente de homens por todo o mundo, homens respeitáveis em posições de considerável autoridade. Os comentários que os homens na Nigéria fizeram e a maneira como os fizeram indicavam claramente que eles tinham discutido a questão entre eles antes da minha visita.

Pouco depois do meu regresso de África, numa sessão do Corpo Governante em 17 de fevereiro de 1980, Lloyd Barry expressou outra vez o que pensava sobre a importância do ensino a respeito de 1914 e de "esta geração". Lyman Swingle disse que a matéria publicada nas "Perguntas dos Leitores" em 1978 não tinha deixado o assunto esclarecido nas mentes dos irmãos. Albert Schroeder contou que na Escola de Gileade e nos seminários das Comissões de Filial, os irmãos disseram que falava-se agora de 1984 como sendo uma nova data possível, sendo que em 1984 passavam setenta anos sobre 1914 (o número setenta era evidentemente olhado como tendo alguma importância especial). O Corpo decidiu discutir novamente o assunto 1914 na próxima sessão.11

O Comitê do Presidente, constituído por Albert Schroeder (Presidente), Karl Klein e Grant Suiter, produziu então um documento muito pouco usual. Eles forneceram uma cópia a cada membro do Corpo Governante. Dito de maneira simples, estes três homens sugeriram que, em vez de se aplicar a pessoas que eram vivas em 1914, a expressão "esta geração" começaria a aplicar-se em 1957, quarenta e três anos mais tarde!

Esta é a matéria exatamente como estes três membros do Corpo Governante no-la deram:

Para os Membros do Corpo Governante -- Em Agenda para Quarta-feira, 5 de março '80

Pergunta: O que é "esta geração (genea')?" (Mt. 24:34; Mr. 13:30; Lucas 21:32)

TDNT (muitos Comentários) diz genea' "denota principalmente o sentido de contemporâneos." Vol. 1, p. 663

Quase todos dizem que genea' difere de genos; genos significa descendência, pessoas, raça. Veja TDNT Vol. 1 p. 685 (genos em 1 Pedro 2:9)

A resposta pode estar relacionada com a questão em Mt. 24:33. O que é que se quer dizer com: "Quando virdes todas estas coisas"?

O Comentário de Lange (Vol. 8) sugere que "estas coisas" não se refere a 70 E.C., nem à parousia de 1914 mas aos versículos 29, 30 os fenômenos celestes que agora vemos começaram a era espacial de 1957 em diante. Nesse caso seria então a geração contemporânea da humanidade vivendo desde 1957.

Três Secções

O Comentário de Lange divide o 24.º capítulo de Mateus em "três ciclos."

O 1.º ciclo dele -- Mat. 24:1-14
2.º ciclo -- Mat. 24:15-28
3.º ciclo -- Mat. 24:29-44 (synteleia ou conclusão)
(Veja Vol. 8 pp 421, 424 e 427)
Baseado na questão de Mat. 24:3 em três partes.

The Watchtower e O Reino de Deus de Mil Anos (ka) também dividiram agora Mateus 24 em três partes por assim dizer

(1) Mat. 24:3-22 Tem cumprimentos paralelos no 1.º século e nos nossos dias desde 1914. (Veja w 75 p. 273, ka p. 205)

(2) Mat. 24:23-28 Período dentro da parousia de Cristo de 1914. (Veja w 75 p. 275)

(3) Mat. 24:29-44 "Fenómenos Celestes" tem aplicação literal desde que começou a era espacial em 1975 e dai em diante até incluir a erkhomenon de Cristo (vinda como executor no princípio da "grande tribulação.")
(Veja w 75 p 276 par. 18; ka pp 323 a 328)

"Todas estas coisas" teria de remeter para trás no contexto para os itens mais próximos no sinal composto, nomeadamente, os fenômenos celestes dos versículos 29 e 30.*

Se isto for verdade:

Então "esta geração" refere-se à humanidade contemporânea vivendo como pessoas com discernimento de 1957 em diante.

*Confirmando no pensamento de C. T. Russell em Comentário Bereano, p. 217:

"Genea, pessoas vivendo contemporaneamente que testemunham os sinais acabados de mencionar." Vol. 4 p. 604.

Comitê do Presidente, 3/3/80

1957 foi o ano em que o primeiro Sputnik Russo foi lançado para o espaço exterior da terra. Evidentemente o Comitê do Presidente pensou que aquele acontecimento podia ser aceite como marcando o princípio do cumprimento destas palavras de Jesus:

"... o sol ficará escurecido, e a lua não dará a sua luz, e as estrelas cairão do céu, e os poderes dos céus serão abalados."12

Baseada nessa aplicação, a conclusão deles seria como eles declararam:

"Então 'esta geração' refere-se à humanidade contemporânea vivendo como pessoas com discernimento de 1957 em diante."

Os três homens não estavam a sugerir que 1914 fosse abandonado. Ficaria como o "fim dos Tempos dos Gentios." Mas "esta geração" não começaria a ter aplicação senão em 1957.

Em vista do decréscimo rápido do número de pessoas da geração de 1914, esta nova aplicação da frase poderia indubitavelmente ser até de mais ajuda do que alguma pessoa vivendo alegadamente 130 anos em certa região da União Soviética. Quando comparado com o início em 1914, esta nova data inicial, daria 43 anos adicionais para o período abrangido pela expressão "esta geração" preencher.

As normas do Corpo Governante requeriam que para um Comitê poder recomendar alguma coisa teria de haver unanimidade entre os membros do Comitê (de outro modo o ponto de vista dividido devia ser apresentado ao Corpo para se tomar uma decisão). A apresentação da nova idéia a respeito de 1957 era portanto uma sobre a qual os três membros do Comitê do Presidente devem ter estado de acordo.

Penso que, se fossem interrogados sobre esta apresentação hoje, a resposta seria, "Oh, isso foi só uma sugestão." é possível mas se é assim, foi uma sugestão feita seriamente. E para Albert Schroeder, Karl Klein e Grant Suiter terem trazido tal sugestão ao Corpo Governante eles devem ter estado dispostos nas suas próprias mentes a ver a mudança sugerida ser feita. Se, de fato, a crença e convicção deles quanto ao ensino já antigo da Sociedade sobre "esta geração" (como tendo aplicação de 1914 em diante) tivesse sido forte, firme, inequívoca, certamente nunca teriam vindo com a nova interpretação que apresentaram.

O Corpo Governante não aceitou o novo ponto de vista proposto por estes membros. Os comentários feitos mostraram que muitos consideravam-no fantasioso. Contudo, o que é fato é que os membros do Corpo Governante Schroeder, Klein e Suiter apresentaram a sua idéia como uma proposta séria, revelando a sua própria falta de convicção quanto à solidez do ensino existente sobre o assunto.

No entanto, até hoje continuam a ser publicadas declarações arrojadas, categóricas, enérgicas, a respeito de 1914 e de "esta geração" como sendo fatos biblicamente estabelecidos pela organização "profeta" e todas as Testemunhas de Jeová são instadas a pôr uma confiança total e a levar a mensagem a outras pessoas por todo o mundo. Num esforço aparente para acalmar preocupações sobre as fileiras cada vez mais pequenas da geração de 1914, a mesma Watchtower (15 de outubro de 1980, página 31 [em português: A Sentinela de 15 de abril de 1981]) que deixou implícito que a idade limite para os membros dessa geração podia ser baixada para dez anos de idade, também disse:

"E se o sistema iníquo deste sistema sobrevivesse até ao virar do século [o ano 2000], o que é altamente improvável em vista das tendências mundiais e do cumprimento da profecia bíblica, ainda existiriam sobreviventes da geração da I Guerra Mundial."

No virar do século, os que tinham dez anos em 1914 teriam noventa e seis anos de idade. Ainda assim, alguns deles poderiam ainda andar por cá e evidentemente isto era visto como suficiente para as palavras de Jesus se cumprirem -- dependendo, é óbvio, da aceitação da idéia de Jesus ter dirigido particularmente as suas palavras a crianças de dez anos.

Hoje não é feita nenhuma menção a crianças "de dez anos" mas em vez disso a referência é simplesmente "àqueles que viviam em 1914" ou similar. Claro que isto permite incluir bebês recém nascidos. Mas agora, na década de 1990, com o terceiro milênio mesmo a chegar, até isto apenas serve de alívio momentâneo para o problema. Mesmo um recém nascido em 1914 teria mais de oitenta anos hoje.

Não faço idéia do que trará o futuro quanto à posição do Corpo Governante nesta matéria. Ao enfatizarem 1914 com vigor redobrado, eles, de fato, "fizeram a cama" e parece que se sentem obrigados a deitarem-se nela. Mas a duração da geração de 1914 está a ser como uma cama que é demasiado pequena para ser confortável, e os raciocínios usados para cobrir essa "cama" doutrinal são como um lençol tecido que é demasiado estreito, incapaz de tapar, neste caso, os fatos objetivos da realidade.

É possível, claro, que algures no futuro eles se sintam obrigados a fazer um ajustamento. Contudo, enquanto os números mostrarem algum aumento, duvido que eles o façam. Custa-me a acreditar que eles aceitem 1957 como a data inicial para "esta geração", conforme proposto pelos membros Schroeder, Klein e Suiter.

Apesar de tudo, eles ainda têm outras opções. Poderiam reconhecer a evidência histórica que coloca a distinção de Jerusalém vinte anos mais tarde do que a data da Sociedade, 607 A.E.C.. Isto faria os Tempos dos Gentios acabar (usando a interpretação dos 2.520 anos, que eles adotam) por volta de 1934. Mas foi dada uma importância tão grande a 1914 e, conforme foi mostrado, o esquema doutrinal está de tal maneira ligado a essa data, que esta também parece uma medida improvável.

Talvez a idéia de Albert Schroeder de aplicar a frase à classe "ungida" (uma idéia que tem pairado à volta da organização por muitos, muitos anos) seja mais atraente. Há sempre mais pessoas (algumas muito jovens) que em cada ano decidem pela primeira vez que são da classe "ungida." Portanto isto daria ao ensino sobre "esta geração" uma extensão de tempo quase ilimitada. (Veja o Apêndice para mais informações.)

Uma coisa que posso dizer com convicção é que pessoalmente acho incrível o modo de raciocinar dentro do Corpo Governante. Parece-me trágico que uma profecia que envolve datas possa ser proclamada ao mundo como algo sólido, em que as pessoas podem e devem confiar, e sobre a qual podem basear as suas esperanças, traçar os seus planos de vida -- quando os mesmos que publicam isto sabem que dentro do seu próprio corpo coletivo não existe uma unanimidade de convicção genuína, firme, quanto à correção desse ensino. Pode ser que quando analisada no contexto de todo o historial da organização, de fixar e mudar datas, a atitude deles se torne mais compreensível.

Talvez mais incrível para mim seja o fato de os membros do Comitê do Presidente, Albert Schroeder, Karl Klein e Grant Suiter, cerca de dois meses depois de terem apresentado a sua nova idéia sobre "esta geração", incluírem o ensino sobre o início da presença de Cristo em 1914 entre os ensinos decisivos para determinar se indivíduos (incluindo membros do pessoal da sede) eram, ou não, culpados de "apostasia" e consequentemente mereciam ser desassociados. Eles fizeram isto sabendo que poucos meses antes eles próprios tinham posto em dúvida a doutrina a respeito de "esta geração," que era um corolário daquela, e lhe estava associada. Mas isso é um assunto que será tratado no próximo capítulo.


Notas

1 Este mesmo material também apareceu na Watchtower de 15 de outubro de 1969 [em português: A Sentinela de 15 de abril de 1970, pp. 238, 239]. Os últimos índices das publicações da Watch Tower, contudo, não o alistam debaixo do subtítulo "1975," simplesmente ignorando-o apesar do seu forte enfoque sobre aquela data.

2 É verdade que (na página 25) é usada a frase menos específica "em meados dos anos setenta", mas o ano 1975 já tinha sido apresentado como sendo uma data Biblicamente marcada e essa data estava agora firmemente gravada nas mentes de todas as Testemunhas de Jeová ao redor do mundo.

3 Citado de Mateus 24:36, 42, 44; Marcos 13:33; Atos 1:7.

4 Isto foi na sessão de 19 de fevereiro de 1975.

5 Veja a Watchtower de 1.º de maio de 1975 [em português: A Sentinela de 15 de setembro de 1975, p. 552].

6 Veja a Watchtower de 1.º de outubro de 1978 [em português: A Sentinela de 15 de janeiro de 1979, p. 32].

7 Dentre os membros do Corpo Governante, na época em discussão, apenas Fred Franz (já falecido) tinha passado do adolescência em 1914, tendo 21 anos de idade na altura. Quanto aos membros atuais, George Gangas tinha 18, John Booth 12, Karl Klein e Carey Barber tinham 9, Lyman Swingle 4, Albert Schroeder 3, Jack Barr 1, e Lloyd Barry, Dan Sydlik, Milton Henschel, Ted Jaracz e Gerrit Loesch ainda não eram nascidos.

8 A expressão "verdade atual" era popular no tempo de Russell e Rutherford e era baseada numa tradução deficiente de 2 Pedro 1:12. A Tradução do Novo Mundo diz, mais corretamente, "a verdade que está presente em vós."

9 Este não parece ter sido apenas um pensamento momentâneo da parte do Presidente Knorr, pois o mesmo ponto de vista foi expresso praticamente nas mesmas palavras por um dos seus associados mais próximos, George Couch. Conhecendo os dois, parece provável que Couch tenha adotado a opinião de Knorr do que o contrário.

10 O Comitê de Redação era então composto por Lloyd Barry, Fred Franz, Raymond Franz, Karl Klein e Lyman Swingle.

11 Contrariamente àquilo que alguns alegam, o próprio Corpo Governante nunca deu importância à data 1984 e, segundo me lembro, esta ocasião foi a única vez em que a data foi sequer mencionada, e isto apenas a propósito de rumores.

12 Mateus 24:29.


Índice